Srta. Eyre 06/09/2024
A Escrava Isaura (com spoilers)
Será que preciso fazer um resumo da obra? Não há muito mistério quanto a sua premissa: uma escrava branca, prendada, criada como uma senhorita rica e livre que, com a morte de sua senhora, se vê aos cuidados de seu perverso filho, Leôncio. Casado com Malvina, ele não sente o menor escrúpulos em tentar seduzir Isaura e afligi-la até que consiga o que deseja.
O que dizer dos personagens? Eu sinceramente sinto que não convivi tempo suficiente com eles para ter um grande apego, mas posso dizer que a Isaura é uma moça gentil, prendada, muito melancólica e triste. Leôncio é um homem mal, mas minha memória da novela (é injustíssimo comparar, mas me é inevitável) era que ele tinha mais personalidade. Malvina era extremamente fofa e querida, Belchior um serzinho de aparência esquisita que é tratado como alguém que não vale nada por sua feiura. No fim, temos o Álvaro, um homem gentil e apaixonado, bastante fofo e muito bem retratado.
O livro é uma leitura rápida e, enquanto eu lia, peguei-me pensando sobre as polêmicas contemporâneas em torno desse livro. A primeira é sobre a escrava ser branca. Acredito eu, sem pesquisar a respeito, que Bernardo escolheu uma escrava branca para causar um certo tipo de identificação. Aí você me pergunta “como assim?”. Veja bem, Isaura era branca, tinha sido ensinada a tocar piano, ler e toda sorte de coisas que as moças de boa família aprendiam. Sendo assim, uma dama que viesse a ter contato com o livro, poderia se ver naquela personagem por ter aquelas qualidades e, com tudo isso, sentir a pressão que Isaura sentia sendo cativa de um senhor brutal, estando presa como uma propriedade e não sendo vista como um ser humano. É genial da parte do Bernardo fazer essa escolha e ficou crível considerando que Isaura também era filha de um português.
A escrita do Bernardo é lindíssima, apesar de alguns reclamaram do “excesso de detalhes”, eu achei a leitura bastante tranquila e enriquecedora. Sendo bem sincera, o que eu não gostava eram das regressões na narrativa, quando ele voltava para explicar um fato, nem da confusão da narração ora no passado, ora alternando para o presente. Eu prefiro quando a história ocorre em uma linearidade e as coisas vão acontecendo.
Outra coisa sobre esse livro é que em muitas situações o próprio autor pensou o quanto determinadas situações pareciam demasiadas e sempre se explicava, dizendo “o leitor deve estar se perguntando como fulano chegou a tal lugar, como descobriu isso ou aquilo”, eu ainda achava pouco convincente. Além de tudo que disse, os momentos do Leôncio, Isaura e Álvaro pareceram tão curtos! E o final? Para mim foi rápido, não fez sentido algum de repente Isaura e o pai se esquecerem da suposta carta que ele escreveu, avisando a Leôncio que tinha se casado. Foi tudo abrupto, a pobre da Malvina nem teve um desenvolvimento por assim dizer.
Bernardo foi sagaz ao escrever A Escrava Isaura. Ele pegou um tema pertinente e conseguiu entrar nas casas e certamente fez muitas senhoras refletirem e, por consequência, os senhores. Há muitos trechos no livro em que o autor crítica duramente a escravidão e o preconceito. Através de seus personagens, ele planta uma ótima semente em seus corações. No entanto, eu queria ter visto mais desenvolvimento e detalhes sobre os personagens, queria que eles tivessem convivido mais.