Matheus 07/08/2020
Ler poesia: viva a experiência Leminski.
A poesia de Leminski é marcada por rompantes. Com isso quero dizer que seus poemas são ágeis, econômicos, quase explosivos. Contudo, ironicamente, é como se o poeta examinasse com uma lupa as potencialidades de cada palavra, para somente acrescentá-las quando a sua participação imprimisse novas e inesperadas camadas ao poema.
A notável proximidade entre Leminski e filosofias/poesias orientais é constante em sua antologia poética através dos haikais (pequenas composições de três versos), que sintetizam a sua proposta "parnasiano-chic", na medida em que a cortante objetividade dos quase-fragmentos exigem do poeta, a um só tempo: objetividade, irreverência e ourivesaria. Nas palavras do próprio Leminski, o esquema do haikai é como "o sangue dos três versos escorrendo na parede da página...".
É justamente nesse ponto, entre a inventividade, o suor da lapidação e a sagacidade dos breves jogos de palavras, que repousa a magia de Leminski. Muitos de seus poemas são tão sintéticos e estilosos, que parecem ter surgido como uma consequência imediata da inspiração ou da sonoridade, ocultando com "jogo de cintura" o artesanato do autor. Sem falar, claro, na presença da poesia concreta e dos "contos semióticos", seu espírito de vanguarda.
Ao terminar essa coletânea, fiquei fascinado com a figura do Paulo Leminski. Poliglota, professor, autodidata, vanguardista e clássico ao mesmo tempo. Morreu antes dos 50 anos, viveu pouco, mas produziu muito e bem feito, e ler um pouco de sua biografia me fez encontrar semelhanças entre a poesia e a trajetória. No fim, sua vida foi curta, mas intensa e inspirada como seus haikais.
"Nenhuma página
jamais foi limpa
Mesmo a mais Saara,
ártica, significa.
Nunca houve isso,
uma página em branco.
No fundo, todas gritam,
pálidas de tanto."