Leonardo 20/04/2020
A banalização do mal em uma sociedade doente
Livro de início muito confuso. A estrutura de texto também não ajuda (em forma de carta, onde a remetente expõe a sua escrita e ao mesmo tempo transcreve a fala e reações do destinatário). Não é, portanto, um diálogo em tempo real, direto. Nesse início de leitura me senti um analfabeto funcional, a autora não contextualizava a situação. Além do início confuso (acho que havia ali uma narrativa em forma de fluxo de consciência; os pensamentos não estão muito bem ordenados), temos uma histeria muito grande da personagem (mãe de Kevin). Sua escrita é catártica. Com mais tempo de leitura vemos um mãe não tão confusa e histérica, e sim, de uma ironia mordaz. Há também muito pessimismo e franqueza em seu diálogo. Ela não queria ter aquele filho. Ela, de forma “egoísta”, se ressentia de sua vida de solteira e de mulher casada sem filhos. A mãe de Kevin relata todas as mudanças ruins que aquela gravidez trouxe para a sua vida. Com o tempo, o livro fica melhor ainda, pois à medida que Kevin cresce, também cresce um olhar mais analítico de sua mãe sobre ele. Na interação entre os dois, Kevin expõe sua maldade de forma dissimulada. A mãe, por sua vez, se mostra sarcástica (era uma espécie de autodefesa). Enfim, um jogo de gato e rato. De certa forma eles se completam como se vivenciassem uma simbiose. O livro carece de notas de rodapé. Talvez fosse intenção da autora nos deixar meio “boiando”. A narradora (a mãe de Kevin) é muito culta, pensa rápido. Faz menção a muitos personagens e termos que tive que pesquisar no Google. Nos diálogos muitas coisas estão nas entrelinhas. Muitas. Isso é uma constante. Não captei tudo. Achei muito engraçado o perfil do pai de Kevin. Me lembra uma personagem humorística que tinha uma venda nos olhos (em um sentido figurado), pois não via que claramente o filho era um baita de um drogado e a filha era homossexual. O filho, em casa, estava sempre louco, na fissura, com mania de perseguição e esquisito; a filha, detinha gestos e hábitos totalmente masculinizados, saía muito com uma “amiga” kkk só o pai, desesperado, tentava alertar a esposa sobre tudo aquilo que estava bem diante de seus olhos. E a mulher dele sempre tinha uma bondosa desculpa, achava que era implicância do marido rsrs assim é o pai do Kevin! Ele chega a ser forçadamente muito cômico e surreal de tão ingênuo. Na narrativa, em certos momentos, a autora tece considerações contra a indústria armamentista e contra o contexto psicológico coletivo (contexto este que levava ao efeito dominó: autores de massacres influenciando futuros autores de outros massacres. Foi ressaltado um clima de “competição” para ver quem matava mais, quem ficaria mais famoso). Foi retratada uma sociedade doente que não sabia bem ao certo as razões para tantos massacres (havia algumas suposições não muito convincentes como envolvimento com satanismo, desilusão amorosa, bullying sofrido pelo autor do massacre, a existência de pais ausentes). O mais desconcertante na história de Kevin (e de outros autores de massacres) é que não há uma explicação realmente plausível para esses fatos. Isso desconcerta a sociedade, isso nos desconcerta como leitores, pois criamos uma grande expectativa de saber o porquê de tudo aquilo. Por que há o mal? Por quê? Não há respostas seguras, infelizmente. Leitura muito densa e angustiante, mas que cumpre, portanto, a finalidade a qual se propôs. O começo do livro, e os diálogos poderiam ser mais claros para o leitor, só por conta disso, não dou nota máxima.