Fabio Martins 07/08/2015
A guerra do fim do mundo
Nasci e moro em São Paulo. Apesar do trânsito caótico, da superlotação, da poluição e dos preços exorbitantes, São Paulo é uma cidade realmente imponente e completa. É o centro financeiro do Brasil, além de ser o lugar em que se encontra tudo a qualquer hora. E por ser um lugar tão heterogêneo e eclético, me passa uma impressão de que não tem identidade. Não há um trejeito marcante ou um modo de linguagem tradicional que marque permanentemente o paulistano. São Paulo também não tem aquela força cultural, aquela “magia” que engloba um lugar.
E é aí que entra a minha admiração pelo nordeste do Brasil. Essa região é recheada de crenças, culturas, folclore e histórias. Em minha opinião, as situações mais interessantes da história do nosso país aconteceram no nordeste. E um dos exemplos mais marcantes foi a Guerra de Canudos.
Em meados do século 19, Antônio Conselheiro saiu em peregrinação por diversas cidades nordestinas, passando a imagem de ser o mensageiro de Deus na Terra. Sempre muito generoso e atencioso aos pobres, rapidamente ganhou adeptos que passaram a segui-lo, chamando a atenção de autoridades locais.
Aos poucos, o número de seguidores cresceu e Antônio Conselheiro decidiu instalar-se em Canudos, interior da Bahia. Em suas pregações, dizia que a República, recém-instaurada, assim como os impostos cobrados pelo Governo, eram coisas do diabo. O povo de Conselheiro não pagava impostos, roubava terras e coisas, e sobrevivia dessa forma em seus domínios.
Antônio Conselheiro criou seu próprio “país” independente em pleno sertão nordestino. Dizem que a população de Canudos nessa época chegou a mais de 30 mil pessoas, todos seguidores do “mensageiro de Deus” na Terra. Essas pessoas geralmente viviam na miséria e encontraram em Canudos um lugar sem luxo, mas com casas próprias e comida. Em troca, trabalhavam para a comunidade.
Preocupado, o Governo resolveu acabar com os rebeldes e, após quatro incursões (três derrotas vexatórias), os seguidores de Conselheiros foram dizimados. De um lado soldados matando em nome do país, do outro sertanejos matando em nome de Deus. Para mim, essa é a passagem mais fantástica da curta história do Brasil. chamando a atenam a segui-lo. o aos pobres, rapidamente ganhou adeptos que passaram a segui-lo
Fascinado pela façanha de Antônio Conselheiro, o escritor peruano vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 2010, Mario Vargas Llosa, passou meses em Canudos em busca de inspiração para o seu romance sobre o tema. E a inspiração veio. Em 1981, ele finalmente publicou o livro A guerra do fim do mundo.
Seguindo fielmente a linha histórica da guerra, Llosa deu novos tons, histórias e nuances a este acontecimento. Criou personagens pontuais excêntricos, como Galileu Gall, europeu que desejava chegar a Canudos para ver esse incrível acontecimento na história do Brasil. Beatinho, garoto de Pombal, que provou sua devoção por Conselheiro ao ficar com um arame preso à sua cintura por vários meses. Maria Quadrado, carregou por três semanas uma cruz em suas andanças até encontrar o mestre. Em Canudos, se torna a “mãe de todos”. Pajeú, ex-cangaceiro, João Grande, Leão de Natuba e outros personagens marcantes, são os personagens criados por Llosa que acompanham de perto Antônio Conselheiro.
A guerra do fim do mundo é um livro agradável de ler, cheio de histórias paralelas incríveis e com uma riqueza de detalhes que impressiona. Mario Vargas Llosa tem muita facilidade em descrever as passagens, ilustrando perfeitamente com suas palavras as cenas saídas da história misturadas com as que saíram de sua mente. Apesar de ser ligeiramente confusa pelos inúmeros personagens, a obra vale a pena ser lida por ter sido feita cuidadosamente por um dos grandes gênios da literatura moderna.
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