Myzlen1 01/05/2021
Mal entendido em Moscou
Simone de Beauvoir que sempre traz em suas obras as diversas questões que as mulheres de sua época vivenciavam e muito provavelmente pouco mudou, porém, longe de um romance água com açúcar centradas em um homem, Simone nos apresenta Nicole e André em uma visita à União Soviética e neste ponto inúmeras informações nos são entregues, sempre num comparativo direto com Paris, mas longe de ser esse o ponto central da obra, serve apenas para contextualizar e nos entregar um pano de fundo para as constantes diferenças entre a juventude de Macha e a idade de Nicole que está sempre se comparando (ainda que não haja aqui uma rivalidade, mas apenas um sentimento de nostalgia), além do contraste da sua relação com André que parece estar muito à vontade com tudo e apenas deixando que as coisas sigam seu curso. O livro leva um tempo para engatar, enquanto nos perguntamos eventualmente o que de fato está acontecendo e de repente a coisa toda acontece, mas falemos agora da obra como um todo.
No geral a obra é muito boa, mas tem um nicho muito particular, dificilmente irá agradar a todos, ele segue um ritmo mais lento, um pouco melancólico, mas de uma realidade crua e um timing perfeito, os diálogos são bem construídos e para os que se encontram identificados em algum dos personagens, certamente irá arrancar algum sorriso. Talvez por ter me sentido tocado de forma tão especial que eu tenha essa obra em tanta estima e isso talvez possa obscurecer um pouco minha análise, mas espero que não.
Os personagens são cativantes, todos eles guardam características marcantes e possuem personalidade, ninguém fica orbitando ninguém e não seria surpresa se fosse uma versão de uma história real, Nicole particularmente tem os melhores comentários e pensamentos.
A escrita é fluida, tanto quanto a realidade, não será necessário total dedicação e concentração para acompanhar, sendo um livro excelente para ler numa tarde, numa fila do banco ou do médico, com a particularidade de alternar entre os personagens, mas sem comprometer o entendimento.
No mais, é um livro que fala sobre o tempo, sobre as mudanças, sobre amores, sobre amadurecimento e como nos sabotamos todos os dias ao supor o que o outro pensa, Quando jovens tendemos a imaginar que com a idade seremos pessoas muito diferentes, contudo dificilmente largamos certos vícios ou características por vontade própria, quase sempre estamos limitados, pelo tempo, pela idade, pela própria sociedade, mas se reconhecer nisso e acreditar que está tudo bem sem neuras ou inseguranças também deve ser parte do processo. A verdade é que pouco mudamos, mas aprendemos a lidar melhor com quem somos, mas creio que aqui já estou fugindo bastante do tema.