Li 03/04/2019
Sobre amor: por animais, por seres humanos, pela vida
Eu não gosto de circo. Nunca gostei. Fui uma ou duas vezes quando criança e uma vez adulta, quando minha filha devia ter uns 9 ou 10 anos, ainda assim porque era excursão da escola. Por isso, minha postura inicial diante da leitura de Água Para Elefantes era meio, como posso dizer, entediada.
Lançada no Brasil, em 2007 pela editora Arqueiro, a história se inicia na casa de repouso onde mora Jacob Jankowski, um rabugento e adorável senhor de 93 anos que vê todas as memórias escondidas de sua vida surgirem abruptamente com a chegada de um circo no bairro.
Preso num corpo mais lento que sua vontade, Jacob se vê entre seu passado de aventuras e seu presente de tédio, oscilando entre lembranças duras, mas também felizes, e sua atualidade de angustiante espera pelo fim.
O circo revigora suas veias, faz parecer que até aquele momento o sangue em seu corpo parara de correr. As memórias muito vivas que vão invadindo sua mente ganham cheiros, sabores e sons. Jacob se lembra de que ainda está vivo e que a velhice é muito mais do que um tempo de finalizações e perecimento.
Água Para Elefantes trata não apenas do circo e da vida de aventuras e errância, mas da velhice, do amor e das relações entre as pessoas e os animais. Os animais, inclusive, têm nomes. E têm relações com alguns humanos que beiram o parentesco, algo maior que a amizade. É o caso de Queenie, a cadela de Walter, o anão, Léo, o leão, Bobo, o macaco, e a própria elefanta Rosie, por quem Jacob se apaixona quase ao mesmo tempo que por Marlena, a linda e loura estrela que a monta.
É uma história leve, divertida e bastante dinâmica. Para mim, esse é o tipo de história de férias, em que não se precisa pensar muito. Não é algo negativo, é que a disciplina de leitura é como a vida: sobe e desce, vira para um lado e depois para outro; às vezes, há a tensão das situações, em outras, um refresco, um alívio.
Reflexão há, pouca. Como disse acima, você pensa a sua própria relação com o circo e como isso afetou a sua infância e juventude. Você também reflete sobre como nos relacionamos com os animais. e com os outros humanos. E, finalmente, você pensa a própria velhice e como a sociedade encara essa camada da população.
Porém, é tudo uma deixa: um pai que te ensina a andar de bicicleta por alguns minutos. A narrativa não te acompanha nas reflexões. Daí, a ideia de ser vaporosa como uma notícia romantizada de jornal.
De todo modo, o livro me acompanhou nas últimas duas semanas, a leitura e suas reflexões. Nas tardes, nas noites, em alguma madrugada insone. E ouvi atenta e respeitosa a história de Jacob, seu amor por Marlena, por um circo, por uma elefanta, por uns caras miseráveis, por aventuras nos trilhos de um trem. Também conheci seu ódio e não julguei. E gostei. Talvez eu quisesse mais detalhes, mais pensamentos, mais meandros.
No final do livro há uma nota da autora, Sara Gruen, sobre sua pesquisa. Ela dedica a obra a dois elefantes que conheceu. Em sua minibio, na orelha do livro, é mencionado que ela vive em Chicago, com marido, três filhos, dois cachorros, quatro gatos, duas cabras e um cavalo, mas, com um sorriso, pensei: "se esqueceram de colocar 'sem nenhum elefante'".
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