Maria Gabriela 24/12/2021
A vilã apagada em sua própria história
Após um tempo de espera considerável para iniciar a leitura, minhas expectativas quanto a história de origem de uma das vilãs icônicas eram enormes, quase grandiosas. Os vilões desta grande indústria de sonhos e fantasias jamais me decepcionaram e souber de seus passados sempre foi um desejo enraizado em minha pessoa; quando descobri que Úrsula ganharia uma história própria e explicaria sua origem vilanesca, fiquei em êxtase e ansiosa para ver o que e quem havia pisoteado o coração dessa criatura magnífica. Entretanto, que desastre fora a organização... O primeiro capítulo demonstra o poder absoluto que a Bruxa do Mar detém em suas mãos e nos apresenta uma trama irresistível sobre seu passado sombrio e marcado por traumas, como se gritasse a plenos pulmões que Úrsula seria o centro das atenções do início ao fim; porém, com o decorrer da história, percebi que a vilã seria a última personagem a ganhar toda a atenção dos leitores.
O primeiro capítulo nos introduziu o poder absoluto de Úrsula e os poucos que se seguiram que a continham como foco apresentaram sua relação conturbada com o mundo humano e marinho: como sua vida terrestre era tranquila com seu pai adotivo, o único homem que a amou verdadeiramente, para ser destruída ao se unir ao mar e provocar a ira dos humanos; como sua vida marinha era conturbada desde o "acolhimento" de seu irmão, Tritão, que a forçava a se encaixar em seu padrão estético perfeito e abominava sua real aparência. Úrsula perdeu a única pessoa que amava e teve seu amor próprio destruído pelos padrões do irmão, ou seja, sua vida não foi fácil em nenhum momento. Estes pontos foram interessantes e gostei muito da forma como a autora os detalhou através de descrições e diálogos horrorosos e carregados de ódio profundo, mostram como tudo pareceu forçar Úrsula a se tornar uma vilã. Mas todo o foco de sua origem é apagado com a introdução de personagens que, embora tenham tido participação em sua vida, roubaram toda a atenção e tornaram a leitura confusa e quase maçante.
Serena Valentino preferiu, em algum momento, focar nas Irmãs Esquisitas e na Princesa Tulipa antes de lembrar no último capítulo que era um livro sobre a Bruxa do Mar. Isso me chateou muito. Sim, todos os personagens influenciaram em algo na vida de Úrsula, mas o foco absurdo que ganharam tornaram o livro quase inútil no quesito "apresentar o passado trágico do vilão que todos amam". As Irmãs Esquisitas são praticamente as protagonistas do livro e aparecem sempre para chorar enlouquecidas e surtarem de vez pelas saudades da irmã, Circe, que desapareceu; a Princesa Tulipa foi uma humana que ganhou a simpatia de Úrsula no passado, mas de que importa sua evolução como personagem se ela sequer é a principal e apenas uma secundarista? E porque um foco tão absurdo em sua personagem quando ela é a mocinha que não faz nada no livro? É um livro sobre o vilão, por Deus! O livro se resumiu em Irmãs Esquisitas e Tulipa, vez ou outra lembrando que Úrsula é o foco.
Isso desgastou muito a leitura. Os últimos capítulos eram uma bagunça de flashbacks e perseguições das Irmãs, uma vez ou outra mostrando Úrsula usufruir de seu papel em sua própria história. A organização é um completo desastre, aliás! O livro alterna entre passado e presente, entre Úrsula e personagens secundários, entre citar a Malévola e nunca mostrar a trajetória da Bruxa do Mar nos eventos do filme "A Pequena Sereia". O único capítulo que realmente gostei, além do início, obviamente, foi a representação idêntica ao contrato de Úrsula e Arial - admito que li as frases cantando ao ritmo da música do filme. Com exceção destes dois capítulos, os demais foram extremamente chatos e mal organizados. Odeio o Tritão, odiei o choro das Irmãs por causa de Circe, odiei como Tulipa ganhou um destaque absurdo sem que ela merecesse (adorei o personagem evoluído dela? Sim, mas ela é só mais um rostinho num livro que deveria ser SOBRE a Úrsula), e odiei como Serena organizou esse livro. A forma como o livro foi escrito, também, é bem precário e simples demais; poderia ter sido mais rica em detalhes e descrições que não focassem tanto em choros e maquiagens borradas.
É uma história boa jogada no lixo. Aquela que deveria ser o centro das atenções é esquecida e ganha um desfecho tão porco no final que é quase vergonhoso. Sinceramente, lembrarei apenas do prólogo, da conversa com Tritão e do contrato entre Ariel com carinho, o restante farei questão de esquecer. Aliás, a conexão com as demais histórias dos vilões e mocinhos foi bem surpreendente, mas porquê tanto foco? O Fera sequer conhece a Úrsula, então PORQUE RAIOS mencioná-lo a cada duas frases? Dou 3 estrelas pelos poucos pontos positivos, aqueles que Úrsula realmente foi uma vilã, mas não considero esse livro digno de carregar o legado de uma das maiores vilãs da Disney.