LOHS 23/12/2017
Um livro surpreendente
Olá leitores e leitoras, como estão as férias e as leituras de fim de ano? Nunca é tarde para acrescentar mais um, ou alguns, livros a sua lista de natal ou de leituras para o novo ano que está próximo. Underground Airlines, do americano Ben H. Winters, é um livro que aborda um tema que parece desatualizado, mas que na realidade, é algo muito, muito atual sim. A escravidão. Foi uma leitura bem pesada, já adianto, no sentido de que é impossível ser leve se tratando desta temática. Mas é um livro que nos leva a reflexão, então, vamos a resenha?
No mundo criado pelo autor, vivemos num futuro distópico onde nada mudou muito, além do fato de que a abolição da escravatura nos Estados Unidos, nunca aconteceu. O ato da emancipação, emitido por Lincoln em 1863 e a guerra civil que foi resultado deste ato, nunca aconteceram, pois o presidente fora assassinado. Sendo assim, quatro estados mantém o regime de escravidão até a atualidade, são eles: Louisiana, Mississipi, Alabama e Carolina. São estados que sempre foram conservadores na história real e nessa distopia, eles mantém a mão de obra dos escravos, em um mundo moderno. Pode soar louco de início, mas não difere muito do que ainda acontece em alguns lugares do nosso mundo.
A história gira em torno do protagonista chamado Jim (ou Victor, ou Brother), e ele é um ex-escravo. Seu trabalho agora é atuar como um "capitão do mato", um profissional que age na recaptura de escravos fugitivos, e ele trabalha para o governo, aliado a nossa tecnologia. Ele não convive bem com seu trabalho, vive atormentado, mas ainda precisa prezar pela sua sobrevivência acima de todas as outras vidas em suas mãos. É um dilema vivido fortemente pelo protagonista, em meio ao que é viver em locais onde a escravidão é normal e regularizada. As pessoas brancas se responsabilizam pelos seus escravos e estes são vendidos, negociados e marcados como um mero produto, uma propriedade. A única forma de fugir dessa realidade cruel é cruzar a fronteira em uma fuga bem sucedida e encontrar um grupo de abolicionistas. Afinal, ainda existe sim uma resistência a essa "loucura" e ainda há esperança para este mundo. E é nessa trama cheia de ação e reviravoltas (muitas) que somos imersos pelo autor.
Tudo parece irreal quando se trata de uma distopia não é? Onde estamos acostumados a encarar uma narrativa sobre uma sociedade que sofreu e sofre uma opressão forte do governo, onde existem jogos pela vida, pessoas que são clonadas, venda de órgãos, tecnologia dominadora e tudo o mais. Mas não em Underground Airlines. Com esta leitura, não é possível sentir esse tom de fantasia. Para mim, foi mais um retrato mascarado do que ainda vemos e presenciamos, ainda que de olhos semi fechados, no mundo atual, no nosso mundo. É bem triste mas é algo exposto sutilmente (ou não), pelo autor, e que nos leva a filosofar, refletir, buscar informações e permanecer indignados ao perceber que a escravidão, o racismo, é algo presente no nosso dia a dia, no portal de notícias da internet. O que fica é a esperança por um mundo melhor, tanto no livro quanto na realidade. O desfecho não deixa a desejar, gostei muito.
“Freedman Town serve a um bom propósito – não para as pessoas que moram lá, Deus sabe disso; gente metida ali pela pobreza, pelo preconceito, por leis que as impedem de se mudar ou trabalhar. O Propósito de Freedman Town é para o resto do mundo. Um mundo que fica sentado, como Martha, de óculos escuros, olhando de longe, com medo, porém a salvo. Crie um curral como este, não dê às pessoas alternativa senão viver como animais, e depois as pessoas vão apontar para elas e dizer você vai ver aqueles animais? É o que essa gente é. E essa ideia rola de Freedman Town como fumaça de chaminé, negro passa a significar pobre e pobre, a significar perigo, e todas as palavras se confundem e se transformam em uma ideia obscura, uma nuvem de fumaça, os vapores de chaminé vagando como ar poluído pelo resto do país.”
Particularmente, o livro me supreendeu em alguns pontos. Achei que mesmo a história sendo relativamente simples, foi mesmo para chocar. Foi intencional. O personagem é interessante, a trama me envolveu, me emocionou de certa forma e achei um bom livro. Poderia ser melhor em alguns aspectos, para mim, mas acredito ser características que cada leitor opinará por si próprio. Nada que sacrifique a qualidade do livro e da narrativa. Underground Airlines fez muito sucesso nos Estados Unidos este ano, e não é para menos, pois faz parte de sua história, e achei bem abordado e escrito. Recomendo sim para quem gosta de leituras com tons realistas, mesmo que dentro da distopia. E que gostem de refletir sobre o quanto ainda vivemos em retrocesso, e que precisamos muito avançar em diversas questões, como ser humano.
Curiosidade: O título do livro faz uma apologia a Underground Railroads, que foi uma rota de fuga utilizada pelos escravos nos Estados Unidos.
Fica a dica e Feliz Natal para todos, obrigada mesmo por este ano incrível com a gente no LOHS! Até a próxima resenha.
site: http://livrosontemhojeesempre.blogspot.com.br/2017/12/underground-airlines.html