Ana 21/10/2023
A Vida Compartilhada em Uma Admirável Órbita Fechada é a continuação independente de A Longa Viagem a Um Pequeno Planeta Hostil. Ambos os livros fazem parte de uma série de ficção científica criada pela autora Becky Chambers. As obras podem ser lidas separadamente, uma vez que têm arcos bem fechados, mas eu indico fortemente que sejam lidas em ordem de lançamento e logo mais vocês vão entender o porquê.
Eu li A Longa Viagem em 2021, e foi uma história que me surpreendeu bastante pela forma como a autora construiu seus personagens e as relações entre eles. Em A Vida Compartilhada, tive certeza que a vibe da Becky Chambers é realmente abordar questões sociais, e ela faz isso de uma maneira muito bonita e convincente. Diferentemente do primeiro, em que os personagens tinham que resolver alguns conflitos externos além de lidarem com suas próprias existências, nesse volume, temos uma trama muito mais pacata, que gira em torno de duas protagonistas, Lovelace e Sálvia.
Esse é o principal motivo de eu recomendar que vocês leiam os livros em ordem. Conhecemos Sálvia e Lovelace de A Longa Viagem, e os acontecimentos finais desse volume são cruciais para que a gente entenda as motivações dessas duas protagonistas em A Vida Compartilhada. Resumidamente, para não entregar muito do enredo, Lovelace é uma inteligência artificial (IA) que atuava no núcleo de uma nave, a Andarilha. Eu não vou dizer exatamente o que acontece, mas saibam que é tiro, porrada e bomba, e Lovelace precisa — e escolhe — ser transferida para um kit corporal.
Lovelace, que a partir de determinado momento passa a se chamar Sidra, está acompanhada da Sálvia, uma humana geneticamente modificada que vai tentar fazer essa experiência ser o menos terrível possível para ambas. Vale destacar que colocar o núcelo de uma IA em um corpo que imita o humano é ilegal e elas não podem ser pegas. Dessa forma, Sálvia e seu companheiro Azul vão tentar fazer com que Sidra se adapte à sociedade.
De modo geral, eu gostei muito mais de A Vida Compartilhada do que de A Longa Viagem. Como eu disse anteriormente, não há grandes acontecimentos na trama, mas acredito que esse seja o diferencial dela. Imaginem só uma história ser tão boa a ponto de se sustentar sem grandes conflitos? E isso só acontece porque é muito fácil se conectar com essas protagonistas — o que é muito "engraçado" se levarmos em conta que uma delas é uma máquina.
O ponto alto do livro, para mim, é o estilo da narrativa, que alterna presente e passado. No presente, acompanhamos essa adaptação da Sidra, que não se sente à vontade dentro desse corpo humano, mas que não tem muita escolha a não ser permanecer nele. É muito interessante, porque ela é uma IA, mas com consciência e sentimentos, digamos assim, e que está buscando pertencimento dentro dessa sociedade tão diferente dela. No arco do passado, por outro lado, tivemos a oportunidade de conhecer as origens de Sálvia, antes de ela se tornar o que é no presente.
Foi aí, meus amigos, que eu soube que iria amar A Vida Compartilhada. É sob esse ponto de vista que entendemos o porquê de Sálvia ser geneticamente modificada e, principalmente, o porquê de ser tão importante para ela ajudar Sidra. Gostei muito que história dela é contada em uma crescente dentro do livro, já que acompanhamos essa trajetória por muitos anos, até coincidir com o momento atual. Eu amava as partes sob o ponto de vista de Sidra, mas ansiava ainda mais por conhecer a história da Sálvia.
O mais incrível da Becky Chambers, tanto em A Longa Viagem, mas sobretudo em A Vida Compartilhada, é que ela consegue levar para os personagens dela dilemas que nós vivemos diariamente a partir de uma jornada de amadurecimento. O mais doido de tudo é que a autora escolhe justamente uma IA para nos mostrar isso, algo que é totalmente fora do nosso Universo e, evidentemente, muito fora da nossa realidade.
A Vida Compartilhada conversou muito mais comigo que A Longa Viagem justamente por ter menos elementos e, consequentemente, mais espaço para desenvolver cada um deles. Emocionalmente falando, é uma história muito mais carregada, e grande parte disso se dá por falar majoritariamente sobre pertencimento. De certa forma, é como se eu tivesse me encontrado um pouquinho também. Indico demais e não vejo a hora de finalizar a Saga Wayfarers!
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