Queria Estar Lendo 14/11/2018
Resenha: Juntos Somos Eternos
O mais recente lançamento do autor Jeff Zentner chegou aqui no Brasil através da Editora Seguinte. Juntos Somos Eternos é a história sobre três melhores amigos enfrentando o pior e o melhor que a vida tem a oferecer.
Na trama, conhecemos Dill, Lydia e Travis. O último ano de ensino médio está prestes a começar e cada um deles está confrontando esse período de uma maneira; Dill lida com os problemas relacionados ao seu nome e à prisão do pai, ao legado terrível deixado pelo crime que ele cometeu e como isso influencia na maneira com que olham para o filho. Travis se divide entre os problemas com o pai, agressivo e perturbado, e o mundo da série fantástica pela qual é fissurado - um escape para a realidade que ele vive. E Lydia está vivendo entre o mundo da moda e do futuro brilhante que está trilhando e a ideia de que isso a distancia cada vez mais das pessoas que ama.
"Às vezes a música ajudava com a solidão."
Juntos Somos Eternos chegou como uma grande surpresa para mim. O autor já tinha outro livro publicado aqui no país - Dias de Despedida - mas essa é minha primeira experiência com suas histórias; posso garantir que, daqui para frente, vou acompanhar os trabalhos do Jeff como uma grande fã.
A primeira coisa que me ganhou nessa história foi a narrativa. Sensível e vívida e muito crível, ela conta sobre as vidas desses três jovens, sobre seus medos e esperanças, sobre sua convivência e expectativas de maneira muito natural. É fácil se ligar aos personagens, visualizar a cidadezinha em que vivem. É fácil entender a realidade de cada um e de como elas são tão distantes uma da outra, mesmo que eles dividam a mesma realidade desde sempre.
Dill é um protagonista complexo. Seu pai era líder de uma Igreja e tido como um salvador por muitas pessoas; a quebra dessa imagem imaculada pode não ter atingido todo mundo, mas com certeza perturbou o garoto. Dill convive muito com a culpa e com o terror de ser julgado por causa do que o pai fez. Convive com a certeza de que não existe uma alternativa para ele que não continuar vivendo nessa cidadezinha esquecida pelo mundo; a mãe, aliás, é de uma problemática gigante para o rapaz, reafirmando o quanto ele precisa se dedicar a Deus e ao trabalho e seguir a vocação altruísta para a qual foi confiado.
"Vivemos uma série de momentos e estações e memórias sensoriais, amarradas uma a outra até formar uma história."
O que isso causa no emocional e psicológico do garoto é visível e perturbador. Dill é um jovem espirituoso, mas toda a situação em casa molda a maneira com que ele reage ao mundo e aos amigos, aos sonhos deles, principalmente. Dill não tem esperança, não tem sonhos nem expectativas e é doloroso acompanhar seus pontos de vista exatamente por saber do potencial que existe nele, potencial esse apagado pelo abuso emocional que ele vive.
Lydia e Travis são dois pilares para Dill, sustentando o pouco de liberdade que ele encontra fora dos espaços em que o confinam - até mesmo dentro da própria mente. Com os amigos, ele vê possibilidades, ele enxerga o mundo. E o embate silencioso que existe entre esses dois lados da sua personalidade desenvolve todo o seu arco dentro da história. De um lado, o garoto que quer deixar tudo isso para trás, do outro, o filho amedrontado com a ideia de não ter realmente um futuro lá fora.
Lydia é a amiga corajosa e cheia de opinião que sabe se impor - e às vezes se impõe até demais. Eu gostei de como ela se desconstruiu dentro da história; de como viu seus privilégios e aceitou que não podia bater de frente com os amigos da maneira com que achava melhor para eles. Lydia entendeu que o fato de ter uma voz e um futuro não significa que podia perturbar os amigos para obrigá-los a fazer o mesmo; cada um enfrenta suas lutas da maneira que pode.
"As pessoas têm medo do sofrimento. Acham que pega, como doença."
Travis, por fim, se mostrou um garoto de coração gentil e imaginação vívida que arrancou muitas lágrimas da pessoa que vos fala. Um leitor sonhador, que se encontrou em mundos fantásticos, que conhecia muito da crueldade, mas ainda assim escolhia não praticá-la por saber o quanto era nociva às vítimas. Onde Dill era a dúvida e Lydia era a voz, Travis era a bravura em sua maneira pura forma.
O desenvolvimento da amizade desses três foi uma montanha-russa de emoções, e eu falo com tranquilidade que esse é um livro para te fazer sorrir e te fazer chorar muito. Com a narrativa sensível, Jeff apresenta seus personagens e nos aproxima dele de tal maneira que é impossível não passar o livro todo torcendo por aquela ínfima esperança prometida - e é lindo como cada um deles vai descobrindo o que isso significa em suas histórias.
"Nada faz você se sentir mais exposto do que alguém identificando um desejo que você nem sabia que tinha."
As relações familiares são outro ponto muito importante desse livro. Lydia tem uma família estável, amorosa, dedicada; Dill tem uma mãe movida pela religião e um pai cruel que se esconde atrás da alcunha de salvador; Travis tem uma mãe gentil e atenciosa e um pai que carrega fúria e características abusivas. O quanto isso marca os personagens, o quanto cada família influencia e lida com seus filhos, são arcos críticos e emocionantes para toda a trama.
A edição da Seguinte está linda. Eu gostei bastante da adaptação da capa e entendi a mudança no título, ainda que O Rei Serpente faça ainda mais sentido dentro do livro. Tem tudo a ver com a jornada do Dill, mas acaba abraçando só ele - e, para mim, o protagonismo pertence ao trio.
"Ele cantava como se um rio de fogo corresse por dentro dele, como se a música fosse a única coisa bela que ele tivesse."
Juntos Somos Eternos fala sobre fé, esperança e sobre coragem em suas mais variadas formas. É um livro para guardar no coração e para levar consigo por muito tempo; o tipo de história que não desaparece com o tempo, mas se fortifica com ele.
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