Rafael 23/07/2023
Livro do desencanto
Antônio Cândido, famoso crítico literário brasileiro, apontou o "desencanto" como a principal característica dessa obra. E, de fato, não há melhor predicado para defini-la. O livro é um verdadeiro soco no estômago. Não por ser uma estória terrível, nauseante para o leitor, mas pela aridez com a qual o autor desnuda a natureza da vida, da nossa vida. Essa essência do ser vivente é nada mais que uma eterna espera pelos acontecimentos da própria vida. Dino Buzzati nos conduz, em verdade, a uma investigação filosófica sobre o sentido de vivermos e a quê isso se destina. Investigação que culmina no "desencanto" de sermos forçados a enfrentar a resposta simples, mas perturbadora, para tal indagação: a vida é uma eterna espera pela morte. Sim, você pode vivenciar momentos alegres e descontraídos nesse percurso, pode até ser feliz, mas, em algum momento, será possível perceber que, a despeito de tudo isso, no fim o que se espera é, tão somente, a morte. Desfecho que é, para qualquer pessoa, atemorizante, vez que somos naturalmente cheios de expectativas e apego à vida. Esperamos pelo emprego certo, pelo amor verdadeiro, pelas conquistas materiais e, embora seja possível usufruir de parte disso enquanto se está vivo, os percalços da existência e a impossibilidade de atingir todos os nossos objetivos diante da inflexível passagem do tempo, acabam por revelar que, a rigor, vive-se pela espera. Dias melhores sempre estão por vir, até que a morte nos alcance. A genialidade de Buzzati está, não só em esfregar essa ingrata realidade na nossa cara, mas na construção da narrativa que acompanha a vida de um militar cuja função precípua é esperar pela guerra. Contudo, em tempos de paz, a guerra pode acontecer, ou ela se torna mais uma espera da vida? Se você estiver preparado para encarar essa dura realidade, leia este livro.