spoiler visualizarClara K 28/01/2014
Escrita em terceira pessoa, e com onisciência, a obra começa sob um ponto de vista intrigante, na descrição dos atos e ciência da protagonista Briony Tallis. Uma jovem de treze anos que mora numa casa de campo nos Estados Unidos. Ela espera para aquela tarde, de verão e férias, a chegada de seus primos, os gêmeos Jackson e Pierrot, de nove anos, e Lola, de quinze.
Ela é descrita pelo autor, como “Uma dessas crianças possuídas pelo desejo de que o mundo seja exatamente como elas querem. Enquanto o quarto da irmã era um caos de livros abertos, roupas jogadas, cama desfeita e cinzeiros sujos, o de Briony era um santuário erigido a seu demônio controlador.” Toda essa primeira parte nos dá indícios da tragédia que se segue no romance.
A menina é uma aspirante a escritora. Planeja uma peça teatral a ser encenada por ela, em conjunto com seus primos que nem sequer haviam chegado à casa. Sua imaginação nefasta e seu anseio de ordem, a conduzem para uma sucessão de pequenas decepções, criando no ambiente um mal estar que a leva tirar conclusões negativas do que vê. Afinal, a ordem rotineira onde havia sido educada, era agora, de certa forma, invadida e deturpada pela habitação dos seus primos, e também o namorado da irmã.
O autor conduz a narrativa de uma forma que nos permite perceber a trama sob diferentes aspectos. Podemos ler a estória apenas no nível do enredo, e, sob um ponto de vista mais perspicaz, notar a construção da consciência da protagonista, moralista e inflexível. Em breves passagens, percebe-se que sua mãe a faz crer que é a ultima e mais valiosa criança do mundo, criando enormes expectativas na menina. Como quando dá a ideia de encadernar tudo o que escreve, e colocar na estante ao lado de grandes escritores como Rabindrath Tagore e Tertuliano.
Em determinado momento, Briony acusa Robbie Turner, o namorado de sua irmã, de ter estuprado Lola. O estupro nunca ocorreu, porém no fim daquele mesmo dia Robbie Turner já estava na cadeia.
As partes seguintes de Reparação têm uma linguagem mais direta, no nível das descrições. Abordam Robbie Turner, em 1940, cinco anos depois de sua prisão, nos campos de batalha da segunda guerra mundial, como soldado americano, a fim de reduzir sua pena. Ian McEwan transita, aqui, de encadeamentos psicológicos, para descrições ligeiras de um cenário devastado pela guerra. Tal contraste cria uma imagem surpreendente, e talvez seja esse o ponto alto da obra. Na ultima parte, descobrimos que todo o relato do romance é da própria protagonista, já com setenta e sete anos, arrependida da denúncia, que acabou por acarretar todo esse processo que não se conserta, não se repara.
Fica rebatendo nas reflexões do leitor a ambiguidade da palavra título da obra: Briony reparava demais no mundo ao seu redor na sua adolescência, imaginava, e com isso se precipitava nas suas conclusões? Ou agora velha, ela quer reparar o dano que causou na vida de Robbie Turner? Não importa! Os paralelismos da psicologia, são colocados no romance com maestria, dão vida, e identificam o leitor.