spoiler visualizaryanaalmoura 24/02/2024
O bom final que merecia um bom fim
"Aquela fortaleza medonha", o último livro da Trilogia Cósmica, além de ser o mais longo do trio, apresenta uma proposta bastante distinta dos seus antecessores. Nele, C. S. Lewis forjou uma mistura magnífica de ficção científica e fantasia folclórica, criando a sua própria fórmula literária quanto a este gênero.
Jane e Mark Studdock, casal acadêmico progressista, são os protagonistas da obra, ao invés do conhecido Ransom, o que pode causar certa estranheza logo no início da leitura, mas também, renovo. Recém-casados, ambos encontram dificuldades distintas no relacionamento e nas percepções individuais que possuem de si mesmos, distanciando-se um do outro e aproximando-se de propostas estranhas que lhes surgiram de repente. Enquanto Jane descobre seu poder de vidência e começa a lançar por terra a sua visão humanista sobre todas as coisas, Mark busca cada vez mais a aprovação e integração num círculo íntimo, seja em Bracton, a universidade na qual pesquisa, ou no INEC, instituto antiético e um tanto bizarro que acaba por "tomar" a cidade em que vivem.
Além disso, é em Thulcandra, a boa e velha Terra, ou, mais especificamente, no interior da Inglaterra, que todo o enredo se desenrola; nada de viagens para outros planetas, como foi visto em "Além do Planeta Silencioso" e em "Perelandra" e poderia ter sido a expectativa de alguns leitores. Apesar de a história ser habituada num cenário teoricamente familiar, o âmbito terrestre não mantém a sua quietude ou o aspecto natural que conhecemos por muito tempo, desviando-se de uma possível monotonia terráquea.
Os capítulos — dezessete, no total — são densos e compostos de várias páginas, mas não os percebi como chatos ou cansativos, muito pelo contrário, são donos de uma dinâmica agradável e bem compassada, a qual faltou, muitas vezes, nos dois outros livros. Lewis foi ainda mais excelente nesta obra quanto a descrições e diálogos, na construção de supresas e, como popularmente chamamos, pequenos "plot twists", além de firmar maravilhosamente as personalidades, trejeitos e hábitos dos personagens de destaque. E é claro, como sempre, as suas visões filosóficas, culturais, científicas e espirituais estiveram presentes e foram desenvolvidas em peso de distintas maneiras.
Este livro, pessoalmente, não disputa com o resto da Trilogia por honra, ganha o seu lugar como o melhor dentro dela sem muitos esforços. E, durante a leitura, tive uma convicção firme de que ele se tornaria um dos meus livros favoritos, o que se revelou uma certeza tristemente equivocada a partir do último 1/4 da obra.
"Aquela fortaleza medonha" foi decepcionada quanto ao seu trilhar, que prometia ser brilhante e triunfal, para o desfecho — tanto do próprio livro, quanto da série — e deixou *muito* a desejar. Seja quanto à pouca ação e destaque demandados em diversos momentos, à súbita mudança nos personagens, à falta de detalhes quanto ao relacionamento do casal protagonista, à lacuna de muitas perguntas provocadas pelo próprio autor e jamais respondidas, ao distanciamento da pessoa de Maleldil e à falta de boas conclusões em praticamente todas as pontas soltas nas quais esperei por um fim divino, mesmo que não belo. No momento em que foi iniciado o fim, a perda de qualidade e deslumbre da narrativa também começou.
A decepcionante impressão que permanece é a de um final escrito com pressa, sem atenção aos detalhes ou às explicações tão necessárias para a compreensão e finalização deste universo tão fascinante. É uma pena que um autor tão estupendo e genial na literatura como C. S. Lewis não tenha dado a atenção devida ao que poderia facilmente ser uma de suas melhores obras fictícias.