Luisa 24/10/2024
"Uma escritora decidida a desvendar as profundezas da alma"
Meu primeiro livro de Clarice, apesar de ter lido frases de efeito dela por aí. Entendi o clamor; ela é realmente tudo isso que dizem.
Ao longo de treze contos, mergulhamos nos sentimentos mais ordinários e, ao mesmo tempo, mais especiais que nos tornam humanos. Em dez dos treze contos, Clarice captura a realidade tão opressora de ser mulher - seja como mãe, esposa, filha, matriarca, menina. Em "A imitação da rosa" sentimos a pressão esmagadora de ser uma boa esposa - que esmaga até rachar; em "Feliz aniversário" uma dose dupla, a opressão etária de tornar-se a matriarca isolada da família e a obrigação social do cuidado reservado não por acaso à única filha mulher. Em "Preciosidade" o terror de sermos vistas, ouvidas, sentidas pois neste reconhecimento do outro em nós justificaria tudo que nos ocorre - seja por vestir uma roupa curta demais, seja por usar um salto muito barulhento (aquela famosa frase "tava pedindo, né?").
Enquanto mulher, é impossível não me identificar. São os nossos anseios, nossos medos, nossas obrigações espelhadas nela mesma, na autora Clarice. Porque mesmo se Clarice é um dos maiores nomes da literatura brasileira, ela também é, em essência, uma mulher como nós. Por conseguinte, ela também sentiu a (o)pressão de ser uma boa esposa, boa mãe, boa mulher. E como ela tem recurso pra transmitir todas essas angústias! Algumas não tão atuais, outras sim, mesmo após 65 anos de sua publicação.
Sim, o cotidiano pode ser esmagador. Apesar das aparências, existe um mar de profundidade em coisas tão simples quanto pegar a condução voltando pra casa depois do trabalho. E é isso que Clarice nos presenteia.