Larissa.Manucci 27/05/2022A Casa dos Espíritos
Para mim as resenhas mais difíceis de serem escritas são as de livros que eu amei, muitas vezes por serem livros mais complexos, é complicado colocar em tão poucas palavras a enormidade de tudo o que foi escrito pelo autor e de tudo o que eu pude sentir lendo. A Casa dos Espíritos é um desses casos, esse que foi, até agora, a melhor leitura do ano e um dos melhores da vida.
O livro é escrito por Isabel Allende, uma autora chilena que tem uma relação familiar com a política do país e que viveu o período de ditadura no Chile. O livro foi publicado em 1982, mas chega a ser chocante o quanto a essência da história ainda é repetida muitas e muitas vezes nos cenários políticos atuais.
A Casa dos Espíritos se passa no século 20 e mistura o contexto histórico com o realismo mágico ou fantástico. A história é um drama familiar que se estende por três gerações de uma mesma família, a família Trueba. O foco do drama está nas mulheres dessa família, começando com Clara, a clarividente, a espinha dorsal de toda o livro, depois sua filha Blanca e por fim sua neta Alba. Clara desde pequena tinha algumas habilidades psíquicas, ela podia mover objetos com o pensamento, falar com fantasmas e prever acontecimentos futuros, entretanto, toda simbologia fantástica é apresentada de maneira muito sutil e que em nenhum momento tomam conta do livro, eles estão presentes para embelezar ainda mais a história e dar pistas do que pode acontecer.
Clara, ainda jovem, se casa com Esteban Trueba, um homem rico, autoritário, patriarcal e bruto, dono de uma grande fazenda no interior do Chile e o símbolo perfeito do conservadorismo dentro da história. Apesar de tudo, Clara ainda aceita se casar com Esteban exatamente porque ela sabia que aquele era o seu destino, ela pode prever. É então no ambiente da fazenda de Esteban que a família começa a crescer.
Ainda maior do que o drama familiar em si estão as questões políticas que crescem ao longo do livro. Logo percebemos um claro antagonismo política presente dentro da casa, de um lado temos o conservadorismo de Esteban e de outro a extrema esquerda das mulheres que são o destaque do livro. Há um choque de ideias divergentes dentro da família e ao longo da história, a esfera privada (familiar) se expande ao coletivo. É nesse momento que se torna ainda mais claro os conflitos políticos dentro do país, temos um embate entre conservadores e socialistas, temos um golpe militar e uma ditadura. Presenciamos todos os horrores que aconteceram durante o golpe e também depois dele. É um exemplo perfeito do poder, de seus abusos e da impunidade.
Além de toda a questão política, permeia o livro a importância dessas mulheres dentro do veio familiar, temos personagens muito fortes e importantes que quebram diversos paradigmas da sociedade da época e que fazem questão de cortar tradições familiares que não faziam algum sentido. As relações amorosas também estão muito presentes dentro da história e se entrelaçam a questões sociais de classes e políticas.
A história vai aos poucos nos mostrando que tudo na vida é política. Uma das frases do livro que mais me marcou foi uma que Clara usou logo no início do livro: A loucura coletiva parecia não ter fim... e isso é tão real do começo ao fim do livro e também no mundo atual.
Confesso que o início do livro foi um pouco complicado para mim, já comecei julgando e achando que não ia conseguir desenrolar a leitura, mas como eu falei anteriormente, esse é um livro crescente, a história só melhora com o passar das páginas e se torna extremamente envolvente. Com um final muito tocante e verdadeiro... Foram por esses e outros motivos que eu me emocionei muito com o livro e me apaixonei pela história e pela escrita da autora.
Esse é aquele tipo de indicação de livro que tem um peso enorme, é para aqueles que estão preparados para encarar um livro denso, muito transparente em relação a linguagem e a descrições, extremamente reflexivo e com altas cargas políticas.