@fabio_entre.livros 31/08/2024
Impressionista e impressionante
Ainda mais satisfatório do que ler um livro e se apaixonar por ele na primeira leitura é redescobrir esse mesmo livro depois de tentativas frustradas de enxergar sua grandeza. Tal foi minha experiência com "O Ateneu". Somente agora, na terceira (tecnicamente, segunda) leitura, pude apreciar a obra de Raul Pompeia como ela merece. E que livro espetacular ele se revelou!
A rigor, eu gostei da história na primeira vez que li, no ensino médio; o problema era como essa história é contada. Eu achava Pompeia verborrágico e formal em demasia, desnecessariamente erudito e, em alguns momentos, "inacessível". Agora eu assumo minha imaturidade para lê-lo na época, mas também aponto um outro culpado: Aluísio Azevedo. Quando me aventurei em "O Ateneu", eu havia lido "O cortiço" há pouco tempo, e a diferença entre os dois era gritante: o de Azevedo tem narrativa ágil, cheia de ação, violência e sexo, além de empregar linguagem popular (alguns diriam até popular demais). Em suma, o oposto do de Pompeia com seu rebuscamento linguístico e narração contemplativa. Até tentei fazer uma releitura, anos atrás, mas não fluiu e eu abandonei antes de finalizar dois capítulos.
Agora, tudo mudou: a leitura fluiu como por mágica. A linguagem do autor é de uma elegância ímpar, mas exige tempo e disposição para ser devidamente apreciada. O mesmo vale para os recursos narrativos que ele adota, como a ironia feroz cheia de amargura e as quebras de continuidade para dar vazão às reflexões do narrador-personagem Sérgio, enquanto ele reconstrói suas memórias. O uso que ele faz da sinestesia e da metáfora também é genial na construção do microcosmo da sociedade brasileira a partir do internato.
O maior feito do livro, creio, é que ele consegue se adequar aos dois movimentos em voga na época da publicação (Realismo e Naturalismo) sem se prender a nenhum, indo além e se estabelecendo como um dos poucos casos de Impressionismo em nossa literatura. Demorei para enxergar todos esses méritos, mas já dizia o ditado: antes tarde do que nunca.