Joao.Marcelo 10/07/2021
"A Ocupação" de Julián Fuks conta um pouco das histórias dos habitantes de um prédio ocupado na capital paulista. Um sírio, uma haitiana, um boliviano e brasileiros desterrados em seu país natal. Por trás da luta coletiva existem os dramas individuais: o horror da guerra, a catástrofe que destruiu uma família, a miséria absoluta ou a violência doméstica. E, muitas vezes, somente a luta coletiva consegue ajudar as pessoas a se reerguerem de suas ruínas.
O narrador mescla as histórias dos moradores do prédio ocupado aos seus dramas pessoais deixando a certeza que a capacidade de vivenciar o sofrimento alheio nos faz realmente humanos.
"Todo homem é a ruína de um homem, eu poderia ter pensado. Aquele homem que se apresentava aos meus olhos era a encarnação dessa máxima, um ser em estado precário, um corpo soterrado em seus próprios escombros."
"Disseram que você escreve sobre exílio, sobre vidas desgarradas, sobre árvores cujas raízes estão fincadas a milhares de quilômetros ..."
"Najati, Rosa, Demetrio, Ginia. Eles me contam as suas histórias, dizem coisas tão fortes que às vezes turvam os meus sentidos e eu já não sei quanto assimilo, e sobretudo não sei o que lhes devolver, não sei como retribuir.
Só o que faço é deixar que me ocupem, que ocupem a minha escrita: uma literatura ocupada é o que posso fazer neste momento. E é assim, num último movimento, que me vejo perdido - mas não no sentido libertador que você professou naquele dia. Meus ocupantes me conduzem para fora dos meus domínios, e eu já não sei bem por onde vou. Estou escrevendo um livro sobre a paternidade sem conseguir me tornar pai - e sondando a maternidade como se não soubesse que nunca a apreenderia. Estou escrevendo um livro sobre a morte sem tê-la jamais sentido apagar um corpo, numa especulação de sentimentos que um dia se fará risível, quando eu conhecer a dor. Estou escrevendo um livro sobre a dor do mundo, a miséria, o exílio, o desespero, a raiva, a tragédia, o absurdo, um livro sobre esta interminável ruína que nos cerca, tantas vezes despercebida, mas escrevo protegido por paredes firmes."