Théo, um escritor condenado ao fracasso de seu primeiro livro, não conseguiu mais escrever uma única linha. Paralisado diante da incapacidade de realizar uma segunda obra, morre sem conseguir se livrar do impulso destruidor da escrita. Depois de uma recaída em noite tórrida de amor com a ex-namorada, é encontrado morto sobre a cama por ela, que volta para buscar o celular esquecido. No envelope vermelho embrulhado em plástico transparente deixado sobre a cômoda, a inscrição: "Para Sofia".
Théo incumbe Sofia de cumprir seu último desejo: transmitir ao escritor catalão Enrique Vila-Matas uma espécie de legado de angústias - manuscritos de uma obra que nunca existiu. Para cumprir a tarefa, Sofia parte em direção à Paraty, onde está acontecendo a edição 2005 da Flip (Feira Literária Internacional de Paraty), da qual Vila-Matas está participando - e na vida real de fato participou - como um dos autores convidados.
Théo sabia que só um colecionador de esquisitices literárias como o escritor espanhol poderia ver sentido em esboços, frases não terminadas e preâmbulos literários como os que intentou dominar e produzir durante toda a sua vida. Mistura de realidade e ficção, característica também marcante da obra de Vila-Matas, este é o segundo romance de Paulo Roberto Pires, que ao contar essa história de paixão pelos livros, acaba por fazer um inventário artístico, literário e afetivo.
Outra incumbência estranha deixada por Théo para a ex-namorada, com direito a passagem de ida e volta comprada em aberto no nome dela: levar as cinzas dele para Paris, exatamente como sugere o título do livro, tirado da frase célebre de Sigmund Freud: "Se um de nós morrer eu me mudo para Paris.". É nesta viagem que o leitor de Pires embarca, seguindo um precioso roteiro dos marcos literários da cidade, que autor e personagem conhecem a fundo. A começar pela hospedagem no Hotel Aiglon, no "miolo de Monparnasse", onde viveram artistas e escritores, como Giacommetti, Tzara e Carpentier, passando pelo famoso cemitério local, onde jazem Sartre, Gainsbourg, Beckett e Cortázar.
No destino imposto a Sofia, o autor nos conduz por uma outra jornada, em que, como nos romances de Vila-Matas, a compulsão pelos livros e o desejo de fazer parte da memória da literatura torna-se uma enfermidade que subjuga o escritor. Se um de nós dois morrer é uma viagem que mostra os possíveis efeitos do arrebatamento literário sobre o indivíduo - uma reflexão bem-humorada de um homem surpreendido e irremediavelmente atraído pelo poder da literatura.
Ficção / Literatura Brasileira / Romance