André Carneiro, artista brasileiro de múltiplos
talentos, nasceu na cidade de Atibaia, São Paulo, no
dia 09 de maio de 1922, e partiu para o outro lado
da Matrix em 04 de novembro de 2014. Ou melhor:
não partiu; ficou. E permanecerá, como provam os
textos e depoimentos de autores, editores e leitores
que vocês lerão a seguir.
Entre as várias atividades que desempenhou
(apenas para exemplificar: escritor, poeta, escultor,
hipnólogo, pintor, fotógrafo, cineasta, diretor de
propaganda, comerciante e artista plástico1), uma é
de nosso especial interesse: o escritor de ficção científica,
mais reconhecido no exterior do que em sua
terra natal. Porém, não falaremos apenas do André
escritor de FC. Tentaremos mostrar, embora em rápidas
pinceladas, um pouco de suas outras habilidades.
Edgar Smaniotto, por exemplo, nos apresenta
textos sobre obras de Carneiro que tratam de hipnotismo,
fotografia, cinema, colagem e pintura, e compartilha
seu parecer acerca do ensaio Introdução ao
Estudo da ‘Science Fiction’. Já Silvio Alexandre, além
da completa e atualizada bibliografia de Carneiro,
que minuciosamente pesquisou (uma imponente
bibliografia, como vocês terão a oportunidade de
ver), nos traz um texto que relata cargos exercidos
e discorre acerca de trabalhos e premiações no exercício
de diversas atividades artísticas. Por sua vez, o
psiquiatra Paulo Urban igualmente nos brinda com
um texto biográfico, durante o qual destaca marcantes
aspectos da escrita e pensamentos de André, citando
trechos de poemas. Nosso fanzine apresenta
também um importante texto de Roberto Causo,
com apreciações de diversas personalidades acerca
do autor homenageado e seus trabalhos.
André foi assíduo colaborador do Somnium,
mantendo uma coluna fixa durante longo período,
intitulada Crônicas do André. Duas destas crônicas
serão aqui republicadas2 e representam àqueles que
ainda não leram André Carneiro uma oportunidade
para conhecerem um pouco de suas opiniões e
terem uma ideia – ainda que tênue – da maestria
de sua escrita. Àqueles que o conhecem há tempos,
creio que estes textos consubstanciarão uma agradável
lembrança.
Além das qualidades artísticas, o autor homenageado
nesta edição também sempre se mostrou
generoso no compartilhamento de seu talento. Por
vários anos, esteve à frente de um profícuo movimento
literário na cidade de Curitiba: as Oficinas de
Literatura e Cinema. Durante este período, incentivou
e orientou novos autores e autoras. Mustafá
Ali Kanso, por intermédio do texto “André Carneiro
e suas oficinas de literatura”, nos dá um panorama acerca da importantíssima participação de André
nestas reuniões.
Ainda sobre as opiniões e pensamentos do autor
homenageado nesta edição, merece especial menção
a reveladora entrevista por ele concedida a José Carlos
Neves no ano de 2006.
Enfim, esta edição especial traz textos que discorrem
sobre o autor e seu trabalho, com destaque para
sua atuação como escritor de ficção científica. É claro,
a exemplo do que ocorreu em edições anteriores
(quando prestamos homenagens a outros autores
de renome no âmbito da ficção científica mundial),
não conseguiremos comentar toda a vasta produção
do mestre André Carneiro, mas creio que será
o suficiente para mostrar um pouco do seu legado.
Teremos, inclusive, como de costume, resenhas de
algumas de suas mais importantes obras. Caberá ao
interessado leitor buscar o aprofundamento em seus
escritos.
Ao final, um presente para os fãs: o penúltimo
texto concluído por André Carneiro – a noveleta
Antes de Bagdad, o deserto, gentilmente enviada
por seu filho Maurício Soares Carneiro. Aliás, deixo
aqui um agradecimento muito especial a Maurício
e Henrique, filhos do autor homenageado, pela cordialidade
e apoio a esta edição.
Antes de Bagdad, o deserto não é ficção científica,
embora flerte levemente com o fantástico. Não é
FC, mas é André Carneiro. E em um texto que nos
cativa do início ao fim, deixando-nos na expectativa
pela resolução da trama. Vale frisar também que
esta noveleta foi escrita em 2013, após o autor ter
completado noventa e um anos de idade, diante de
uma escuridão que muitos poderiam comparar à vivenciada
por Wladas3. Eu diria que ela se assemelha
mais à escuridão desafiada (e vencida) pelos guias
deste personagem4. Afinal, André Carneiro nunca
foi guiado. Pelo contrário: ele sempre guiou, conduziu
com seus trabalhos e ideias, desafiando paradigmas.
E continuará a fazê-lo, por intermédio de sua
obra.
É nosso dever contribuir para que seu valioso
tesouro cultural seja compartilhado com as futuras
gerações.