“Nós precisamos de Zami, das memórias que compõem este livro, pois são memórias e histórias que nos atravessam, ainda que não sejam contadas ou que sejam postas em silêncio por pudor, por vergonha imputada, em nome da ordem, porque insistem em dizer e tentar nos convencer de que aquilo que somos não é certo ou não importa. Zami guarda histórias pelas quais almejamos porque são nossas histórias.
Lorde, você nos ensina a encontrar voz e a saber usá-la, a buscar aquelas palavras das quais precisamos e desejamos. Que presente inestimável te encontrar nesta vida, te encontrar mais uma vez aqui. Zami, pensei, ao chegar ao fim de suas páginas já com saudades, é um dos galhos daquelas árvores que a pássara sem pés tanto procurou, pois aqui, no abrigo de suas folhagens, pousamos em segurança como no colo de nossas mães, todas elas.”
— Cecília Floresta, no prefácio
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Publicado originalmente em 1982 e até então inédito em português, este livro de Audre Lorde — poeta, ensaísta e ativista negra e lésbica — narra os primeiros passos de sua jornada até a “casa de si mesma”, em uma trajetória marcada, do início ao fim, pela conexão com outras mulheres. Chamado não de autobiografia, mas de biomitografia, é um emaranhado indissolúvel de conteúdo autobiográfico e ficção, no qual as histórias das mulheres que fizeram parte da vida da autora são reverenciadas e integradas à sua própria construção identitária. Zami traz as recordações dos primeiros 23 anos da vida de Lorde — de sua infância, marcada pela personalidade grandiosa de sua mãe, pela descoberta do mundo, da injustiça e do pertencimento; de sua adolescência, quando florescem os primeiros poemas; de sua juventude, com a descoberta do amor homossexual e as consequentes dificuldades de ser lésbica e negra nos anos 1950. Zami é a força dessas mulheres que amam umas às outras. Lorde oferece ao público as suas praias da memória, que guardam a cor da solidão, os lugares secretos da dor, mas também os rituais de mulheres negras penteando os cabelos de suas filhas, o cheiro macio da manhã, as marés do corpo forte da amante no encontro erótico. Mais do que isso, Zami dá voz e reconhecimento àqueles corpos constantemente silenciados, indesejáveis aos olhos do patriarcado branco e heterossexual, mas que resistem, não cedem, permanecem. Que erigem a morada da diferença e se fortalecem sob o amor e o afeto que tornam a vida possível.
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