Katia.Caja 09/02/2012
Simplesmente detestei o livro. É um ode à brutalidade masculina adolescente justificando-a com o falso pretexto de "era apenas imaturidade".
O personagem principal é extremamente violento, mas não há nenhuma justificativa para a sua maldade sem limites: nenhuma história por trás, nenhuma explicação de onde saíram todas aquelas atitudes condenáveis.
Quando ele é preso e, depois, submetido a um experimento para torná-lo uma pessoa decente, o autor condena tal experimento com o argumento ("cristão") de que o livre-arbítrio do personagem está sendo retirado - e um ladrão estuprador é superior a alguém que não teve escolha a não ser a honestidade. Será? Talvez. O objetivo do livro era provar que sim, mas a mim não convenceu. Mesmo tentando fazer o personagem engraçado, colocando ele como vítima de violência policial e traição, além de abandono dos pais, para que nós nos apegassemos ao "coitadinho", o autor não conseguiu me fazer simpatizar ou torcer para um personagem que, sem qualquer justificativa, cometia violência tão extrema, por hobbie.
No meio do livro é que acontece a cena mais imperdoável. O protagonista, após obter a "cura" para sua perversidade, é espancado e reage de maneira caricatural, "lambendo as botas" do seu agressor. Nessa parte a gente deve se questionar se é saudável retirar toda a agressividade de uma pessoa, chegando ao ponto de impedí-la da auto-defesa legítima. Afinal, alguma agressividade seria natural e até saudável. Mas logo após, ao personagem é mostrada uma mulher belíssima e semi-nua, despertando no personagem um instinto de estupro e agressão. Ele reage de maneira cortês e cavalheiresca, dando a entender que o estupro é um instinto natural masculino, e tratar uma mulher razoavelmente, uma mostra de domesticação patética e indesejável. O autor coloca no mesmo patamar lamber as botas de quem o espancou, e tratar cortesmente uma mulher que lhe provocou desejo. Absurdo!
No final do livro, o protagonista se emancipa, por si mesmo, da vida "ultraviolenta" resolvendo casar e ter filhos, um final burguês e medíocre digno de novela da globo. É um final moralizante no sentido de mostrar que o certo é escolher pelo bem por si mesmo, e não por meio de coação. Mas a explicação para essa mudança de atitude é simplesmente "cresci, envelheci"? Bem insuficiente.
Todos nascemos dotados de instintos de alimentação, reprodução, auto-proteção, etc. Se dermos vazão a esses instintos de maneira irrestrita, satisfazendo a eles sem qualquer consideração pelo próximo, a civilização é impossível. Por isso, somos aculturados de modo a nos conformarmos em não suprirmos todas as nossas demandas. Mas, nos homens, os instintos de agressividade não são tão reprimidos quanto na mulher. Os video-games violentos, os desenhos animados violentos, os filmes de terror de ação, a pornografia violenta, tudo isso é bem-visto se for consumido por rapazes, mas não se dá o mesmo com as moças. A elas só se dá de distração o que há de mais inofensivo: bebês, casinha, comidinha, rosa. E tudo o que um garoto possa fazer de errado, é perdoado com o falso-pretexto de "mas ele é moleque, moleque é assim mesmo"... é assim mesmo porque nasceu destinado a ser assim mesmo, ou é assim mesmo por causa da permissividade com a qual esses comportamentos são encarados?
Laranja mecânica é uma maneira ultra-sofisticada de dizer moleque é assim mesmo.
Está tudo perdoado, assim que o cara cresce um pouco e forma uma família burguesa tradicional. As vidas das estupradas que ele arruinou? Não vem ao caso.
Aliás, falando em vida arruinada, pobre diabo o Alexander. Teve a mulher estuprada e morta por 4 homens diante de seus olhos, além de sua obra literária destruída. Depois acolheu com todo o carinho o estuprador: lhe deu banho, comida, bebida, carinho, cama, e quando descobre sua verdadeira identidade, o governo o afasta da possibilidade de vingança. Nunca senti tanta pena de um personagem.
Enfim, só não dou a pior nota para o livro pelo grande mérito que ele tem em termos de uso da linguagem.