Felipe Berlofa 27/11/2023
Uma Jornada Íntima pelos Contos de Katherine Mansfield
"Por que ter um corpo se é preciso trancá-lo numa caixa, como um violino muito, muito raro?"
Nota: 5/5
Editora: Antofágica
Confesso que tenho uma afinidade especial com narrativas que exploram as complexidades psicológicas do cotidiano, uma predileção que me conquista facilmente. Não é à toa que Virginia Woolf e Clarice Lispector ocupam o posto de minhas autoras favoritas nesse quesito. Ao descobrir que existia uma escritora capaz de despertar inveja em Virginia e inspirar Clarice, não hesitei em mergulhar em sua obra. E, sem decepção, a experiência foi magnífica!
Katherine Mansfield, nascida na Nova Zelândia em 1888 e grande parte de sua vida vivida na Inglaterra, transcendeu fronteiras em sua vida e escrita, como destacado nos textos de apoio da Antofágica e Talissa Ancona Lopez (2023). A autora enraizou em sua obra uma experiência que transita por diversos territórios, sotaques e contrastes.
A coletânea de contos, primorosamente escolhida e traduzida por Nara Vidal, foi uma experiência arrebatadora. Composta por cinco contos de Mansfield - "Êxtase", "A aula de canto", "Festa no Jardim", "A vida de Ma Parker" e "As filhas do falecido coronel" - cada conto me cativou, principalmente pela habilidade de Mansfield em convidar o leitor a contemplar suas personagens em situações cotidianas e sentir seus questionamentos, suas epifanias sobre a vida. A prosa de Mansfield nos faz não apenas observar, mas nos identificar com essas personagens, vivenciando suas perguntas.
Como afirmado por Lopez (2023), "ela mostra, através dessas mulheres, que a questão está sempre dita em gestos cotidianos ou falas inesperadas que revelam um inevitável descompasso entre o desejo intenso e as possibilidades um tanto limitadas".
Os contos exploram temas como luto e ausência, questões de classe social, e a complexa questão do feminino e da feminilidade no século XX. A medida que nos aprofundamos na habilidade da escrita em desdobrar esses assuntos, somos conduzidos mais profundamente nas personagens, em suas psiques e impressões sobre os temas. E o mais fascinante é que elas nunca são as mesmas do início ao fim da história, transformando-se diante dos nossos olhos.
Dos cinco, meu conto favorito foi "A vida de Ma Parker". É um conto majoritariamente sobre luto e me fez chorar e pensar muito em seu final. Mas, todos os contos e personagens de Mansfield tem muito a nos dizer e nos perguntar. Particularmente, você não sairá o mesmo depois dessa coletânea, e assim como suas personagens, você será conduzido por esse desfiladeiro de afetos e se perguntará ao final: Como estar na presença do outro sendo nós mesmo? Ou como estar com o outro, sendo ele tão próximo e tão diferente de mim?
Sem sombra de dúvidas, ainda me questionarei ao longo da vida tudo o que esta obra me fez pensar. Mas ela saí deste ano de 2023 como sendo a minha favorita ❤️.