Toni 16/03/2023
Leituras de 2022 | Cortesia da editora
Futuro ancestral [2022]
Ailton Krenak (MG, 1953-)
Cia. das Letras, 2022, 128 pág.
Num primeiro momento, a leitura de “Futuro ancestral” pode parecer algo repetitiva para aqueles e aquelas que já passaram por “Ideias para adiar o fim do mundo” e “A vida não é útil”, do Krenak. Além de não considerar este um defeito do livro, advirto leitores e leitoras que não se deixem levar pelo pensamento utilitarista de uma leitura que “traga algo novo”. Como o próprio título indica, a proposta filosófica aqui presente se volta precisamente à ideia de uma educação que valorize a construção coletiva, a experiência do sujeito como parte de uma comunidade, e que não seja capaz de dissociar o futuro (uma abstração) de nossa ancestralidade (um fato concreto, ligado à terra e à vida simbiótica).
É contra a cultura produzida por uma sociedade abusiva (fruto da empresa colonial, depois capitalista, agora neoliberal) e que começa nas salas de aula dos grandes centros urbanos, sempre preocupados em “moldar” consumidores e produzir adultos exaustos obcecados por símbolos materiais de sucesso e riqueza, que podemos pensar o risco provocativo dos cinco ensaios presentes neste livro. Para Krenak, “ao focarmos nesse futuro prospectivo acabamos construindo justamente aquilo que Chimamanda Ngozi nos recomenda evitar: um mundo com uma única narrativa. [...] Olhar sempre para o futuro, e não para o que está ao nosso redor, está diretamente associado ao sofrimento mental que tem assolado tanta gente, inclusive os jovens.”
Vivemos uma crise ambiental provocada pelo capitaloceno e fomentada pela arrogância das epistemologias do Norte global (sempre prontas a se colocarem como berço civilizacional e da cultura, em oposição à sabedoria “primitiva" dos povos originários). O desafio, a cada dia mais premente, é não nos rendermos “à narrativa de fim de mundo que tem nos assombrado, porque ela serve para nos fazer desistir dos nossos sonhos, e dentro dos nossos sonhos estão as memórias da Terra e de nossos ancestrais.” Já que nós adultos somos insensíveis irremediáveis, que ao menos as crianças sejam livres para compreender e criar novos mundos possíveis.