Mateus295 24/02/2018
Surreal demais a construção dessa família
Esse foi um daqueles livros que estava juntando pó na estante há um tempão sem motivo nenhum. No entanto, parece que não teve momento mais oportuno do que esse para lê-lo, visto que recentemente a onda de tragédias em escolas norte americanas estão ocupando grande espaço nas mídias. “Precisamos falar sobre o Kevin” vem à tona não apenas para nos chocar com uma tragédia cometida por um adolescente, mas para tentar nos fazer entender, aos olhos da mãe do garoto, as motivações que o levaram a fazer o que fez.
O livro é contado através de cartas escritas por Eva, mãe de Kevin, para seu marido, Franklin. E é através dessas que conhecemos tudo o que precisamos saber, e até o que não precisamos, sobre a história de Kevin. Antes de tudo, somos bem ambientados sobre a vida de uma Eva solteira. Como ela era superambiciosa, independente e que gostava de enfrentar desafios. Até que Franklin aparece na sua vida, e mesmo sendo um modelo totalmente diferente do que ela esperava ser o homem da vida dela, eles ficam juntos.
É uma introdução bem grande, diga-se de passagem, da vida dela e como o Franklin se inseriu nela. Parte que serve apenas para que a gente entenda como a Eva é uma pessoa bem diferente do Franklin. Enquanto ela gosta de viajar e ser independente, ele é aquele sujeito meio quadradão que nutre o sonho de ser pai de um menino.
Por mais que a Eva não tivesse nenhuma pretensão de conceder esse anseio do marido, a sua tara por desafios foi maior e, na esperança que o desejo de ser mãe surgisse quando a criança nascesse, como muitas mães dizem, aceitou o desafio e engravidou. Só que assim que a “semente” apareceu em seu útero, sentiu que aquilo não estava certo. E realmente não estava.
Ao longo do livro vamos percebendo como Kevin, ainda na barriga da Eva, dava indícios que ia fazer da Terra um inferno. São mostradas diversas situações, no decorrer da infância do garoto, em que ele mostra ser uma coisa de outro mundo. É como se ele tivesse uma inteligência maligna e surreal que não quisesse mostrar para ninguém, muito menos para seu pai, que o mimava um bocado. Sendo assim, Eva era a paranoica que via o filho como ele realmente era, enquanto o pai não conseguia acreditar em nada que ela falava porque o Kevin, aos seus olhos, era só uma criança levada, como qualquer uma.
Somos levados a diversas situações em que o Kevin se mostrou ser um caso perdido, e sem motivo nenhum, pois mesmo não sendo genuíno, a Eva tentava ter o comportamento padrão de mãe que tanto é cobrado pelas pessoas. Até que, finalmente, já no final do livro, sabemos como ocorreu a chacina que ele fez na escola, comentada na sinopse do livro. Além de outras coisas que eu não esperava...
“Precisamos falar sobre o Kevin” é um livro com uma trama bem adulta. Então espere por períodos longos, palavras difíceis e desnecessárias, algumas contextualizações que não acrescentam em nada... Mas também espere por um aprofundamento psicológico absurdo. Uma construção de uma família totalmente diferente do que você já pode ter lido.
Acredito que o livro se preocupa bem mais em montar uma imagem caótica de família, do que necessariamente contar sobre a chacina. Por mais que seja um pouco desgastante ler todos aqueles capítulos iniciais sobre a vida da Eva antes de ter o Kevin, eles são essenciais para entendermos sua relação com o filho posteriormente. Assim como é de puxar os cabelos da cabeça ver o quão cego o Franklin é pelo filho, em alguns capítulos, e como o Kevin é uma pessoa surreal e ao mesmo tipo sutil e inteligente em não demonstrar isso para o pai. Ou seja, a leitura é bem desgastante em alguns momentos, mas nos momentos certos ela recompensa com uma trama surreal que faz a gente ficar de boca aberta com a existência do Kevin, e como ele tem 0 motivos para ser desse jeito.