Isadora1232 11/09/2021"Suportamos a existência tentando converter o banal em épico".
Marçal Aquino tem uma escrita poética, o que é bem sintetizado nos títulos dos capítulos: "carne-viva", "postais de Sodoma à luz do primeiro fogo", "poema escrito com bile". A beleza vem muitas vezes de onde menos se espera - do banal, do grotesco e da tragédia.
As falas e os personagens refletem o ambiente hostil e preconceituoso das regiões exploradas pelo garimpo. Também não se pode ignorar que o livro já tem mais de 15 anos. Mesmo assim, meus olhos doíam ao ler algumas expressões racistas, homofóbicas ou misóginas.
O protagonista também é um sujeito de difícil identificação e simpatia. Ele fala do amigo pedófilo como se fosse a coisa mais natural do mundo, e, com exceção das referências maternas, sua relação com as mulheres se limita ao interesse sexual.
Nesse aspecto, achei a história de amor do Careca muito mais interessante. Eu definitivamente compraria o livro sobre a devoção platônica dele à Marinês.
Apesar dos pesares, considero muito boa a forma como o autor conduz a narrativa. Pra mim, a falta de linearidade é o ponto alto do livro, junto com sua linguagem poética. Aos poucos, as pontas soltas vão se conectando e a tragédia anunciada nas primeiras páginas vai passando a fazer sentido.