spoiler visualizarMano Beto 26/02/2024
Nós - A Investigação
Comentei por aqui que há muito tempo li apenas o primeiro conto da Trilogia de Nova York - Cidade de Vidro. Depois deste longo período, resolvi reler, mas desta vez a trilogia completa. E acho que o tempo acabou auxiliando na leitura.
O livro é composto por três historias: Cidade de Vidro, Fantasmas e Quarto Fechado. Todas tem algo em comum - a perda de nós, do eu. Sim, o livro não se trata de uma investigação. Bom, ela está lá, todos os possíveis detetives estão tentando descobrir algo, mas durante a jornada, quem realmente precisa ser investigado são eles mesmos. E cabe a nós leitores assumir, de forma bem amadora, o papel de possíveis investigadores dos protagonistas.
Mesmo com a última história apresentando uma premissa que a principio seja um pouco diferente das demais (nas histórias anteriores, os protagonistas se perdem na investigação, em Quarto Fechado, o personagem se perde dele mesmo ao "assumir" a identidade de outra pessoa), no final todo ficam perdidos, se perdendo neles mesmos. E nós, ficamos perdidos também tentando investigar os protagonistas.
Vale destacar a forma como o livro é escrito. Em Cidade de Vidro, quando Quinn encontra com Paul Auster (Sim, o autor também é um personagem no livro), Auster fala que está escrevendo um livro questionando quem realmente escreveu Dom Quixote, sugerindo que uma outra pessoa tivesse escrito a obra. E ao terminar todos os contos, eu fiquei me perguntando se realmente Paul Auster escreveu o que escreveu rs. Confuso né? Mas é a intenção. E o mérito é todo de Paul em conseguir transmitir esta sensação com o livro.
Quem disse que investigações seriam tão fáceis não é mesmo?
Mesmo com a leitura concluída no Kindle, não perdi a oportunidade de marcar alguns trechos:
"Desde muito tempo eu vinha lutando para dizer adeus a alguma coisa, e essa luta é, na verdade, tudo o que importa. A história não está nas palavras, está na luta."
"Se as palavras se seguiram foi apenas porque eu não tinha outra escolha senão aceita-las, assumi-las como minhas e seguir para onde elas desejassem me levar."
"A solidão tornou-se um caminho para o eu, um instrumento de descoberta."
"É isso o que a gente acaba aprendendo da vida: Como ela é estranha. Não dá para prever o que vai acontecer. Não dá nem para imaginar."
"Escrever é um trabalho solitário. Domina a vida da pessoa. Em certo sentido, um escritor não tem vida própria. Mesmo quando está sem um lugar, na verdade não está ali."
"Existimos para nós mesmos, talvez, e às vezes chegamos até a ter um vislumbre de quem somos realmente, mas no final nunca conseguimos ter certeza e, à medida que nossas vidas se desenrolam, tornamo-nos cada vez mais opacos para nós mesmos..."
Trechos um tanto intimistas para uma investigação não?
Viver é uma investigação, mas com a certeza de não chegar a conclusão alguma. Pois viver não está definido.
Vale a pena a leitura, mesmo se perdendo (como me perdi) durante minha investigação. E é isso que torna o livro bacana.
Agora voltarei para Clarice rs.