arthurzito 04/03/2024Essa leitura me fez pensar sobre a História e em como ela construída de forma a ser excludente, já que é escrita sempre pelo vencedor, a versão do perdedor é deixada de lado e a História se faz num perspectiva de marginalização. Julia Lopes de Almeida foi uma mulher influente, uma escritora de qualidade ímpar, ajudou a construir a Academia Brasileira de Letras, recebeu em em sua casa grandes dos vários escritores importantes do século XX. O seu legado? Deixado de lado, não ingressou na ABL mas seu esposo sim. São detalhes que fazem refletir.
O enredo de "A falência" segue a trajetória da família Teodoro em meados do século XX. Francisco Teodoro é um empresário do café que se casa com Camila, juntos constroem uma família influente na vida urbana carioca. Pelo menos todas as resenhas que eu li já deixam explícito que haverá uma falência seguido do suicídio de Francisco Teodoro. Mas o enredo é construído de forma linear, sem menções ao futuro e com poucos flashbacks do passado, então eu tive durante toda a leitura essa expectativa de um tremendo desastre. Ler o cotidiano dessa família, assitir a vida tumultuada de Francisco, o caso de Camila com dr. Gervásio, as irresponsabilidades do filho mais velho, as aspirações das caçulas e sabendo que tudo isso está por um fio é extremamente inteligente, interessante e bem feito.
Além disso, Júlia Lopes faz um romance cheio de críticas sarcásticas à sociedade carioca e à Igreja, especialmente voltado ao papel da mulher nesses dois ambientes. Camila tem um caso duradouro com médico e amigo da família, dr. Gervásio, e sente a fúria da hipocrisia de suas tias católicas e de seu filho mais velho boêmio e irresponsável (mimado por ela mesma, mas mesmo assim hipócrita). Eu consigo sentir as inspirações que fizeram ela escrever os diálogos, principalmente quando depois da morte do esposo, Camila tem um monólogo que me deixou emocionado. É uma leitura que vale a pena!