Júlia 13/02/2022
fazem alguma semanas que eu terminei esse livro, mas eu não consigo parar de pensar em toda a história, então resolvi escrever essa resenha.
eu li Os Miseráveis em 1 mês. o que eu acho rápido, considerando que o livro tem 1512 páginas, mas o mérito é todo do Victor Hugo.
Victor Hugo é, de fato, o homem do século. a maneira concomitante em que ele aborda a narrativa com as questões políticas e históricas faz com que seja impossível largar o livro. eu confesso que estava muito intimidada pelo seu tamanho e pelo valor que a obra tem, mas logo nas primeiras páginas eu percebi que Os Miseráveis iria se tornar o meu livro favorito da vida.
grande parte das pessoas se queixam que o Victor Hugo, em momentos cruciais do livro, interrompe a narrativa para abordar um ponto histórico da França. de acordo com elas, o fluxo da história não só se perde, como fica prolixo e maçante. eu até entendo a queixa, mas não concordo de forma alguma. para além de uma obra a respeito de um núcleo de personagens enfrentando toda a miséria, exploração e crueldade na França, Les Mis é, acima de tudo isso, uma grande (literalmente) aula de História.
quando o Victor Hugo passa páginas e mais páginas descrevendo o sistema de esgoto de Paris, a batalha de Waterloo, a história do convento e a revolução de 1832, não só ele nos traz os fatos (claro, tudo sendo contado com o seu viés também), mas ele deixa todas essas questões totalmente intricadas com o momento da narrativa. para mim, isso é de uma genialidade absurda.
é MUITO óbvio que a escrita do autor é incrível e que ele foi, realmente, um gênio. mas eu ainda fico fascinada com a capacidade que ele teve em construir vários personagens, cada um com diversas camadas e, simultaneamente, abordar todas as questões urgentes à época, de forma a deixar tudo conectado e sem nenhuma lacuna. ABSOLUTAMENTE tudo e todos em Os Miseráveis se interligam de alguma forma. não há nada jogado, sem propósito. tudo está relacionado com outros pontos da narrativa, o que é extremamente magnífico.
após ler o livro, fui assistir uma entrevista de uma professora da Unifesp falando sobre o Victor Hugo. ela afirmou que o escritor era o retrato do romantismo na França, porque ele sabia que tudo que ele escrevesse, publicasse e colocasse no mundo teria um impacto, e ele tinha o propósito de deixar o seu legado. com toda certeza, esse é o grande ponto de Les Mis. muito acima de uma obra de ficção, para o leitor acompanhar a jornada dos personagens, Os Miseráveis é uma obra de estudo. o grande objetivo desse livro é trazer luz à questão do sistema judiciário, dos impactos da ausência da educação, da condição da mulher, da miséria, da exploração infantil e dos entraves políticos, para que nós, ao fecharmos o livro, tenhamos a capacidade de refletir sobre a sociedade em que vivemos e de que forma nós conseguimos contribuir para diminuir essas injustiças. em minha visão, o propósito desse livro é realmente ser desconfortável em certos momentos, para que fique muito claro como tudo é visceral para aqueles que estão às margens da sociedade. Jean Valjean é, por exemplo, o retrato da aporofobia e da sede que as pessoas têm pelo punitivismo. Fantine é o espelho do peso de ser mulher, pobre, mãe solo e invisível para o Estado. todos os personagens, de certa forma, são a própria imagem do que nós sabemos que diversas pessoas enfrentam todos os dias, mas as vezes nos recusamos a enxergar, para continuarmos confortáveis em nossa posição passiva.
enfim, não foi uma leitura fácil, mas valeu muito a pena, principalmente pelas últimas páginas. o que o Victor Hugo fez com as palavras ao relatar a Revolução de 1832 foi fora do normal e mexeu muito comigo. chorei muito, em vários momentos. me apaixonei demaaaais pelo Jean Valjean, pelo abade, pela Cosette e pela Fantine, e odiei com todas as minhas forças os Thernadiér e o Javert. são sentimentos que eu sempre vou carregar comigo, de tão impactante e memorável que essa obra foi para mim. espero que todos possam ler esse livro um dia.