Lary 14/06/2021
Talvez o Brasil não tenha mudado tanto assim...
Policarpo Quaresma provalvemente seria o nosso Dom Quixote tupiniquim de um jeito que só um brasileiro sabe ser.
Essa obra incomoda. Incomoda por demonstrar um Brasil que ainda possui defeitos de séculos passados, mazelas e misérias de séculos passados, preconceitos e autoritarismos de séculos passados.
Lima Barreto foi genial ao escrever um personagem patriota em meio à efervescência que era o Brasil durante a primeira república com todos os ideais de consolidação do regime e um sentimento de que "agora o país irá prosperar". Além disso, é tema constante na leitura às críticas a outros movimentos literários que buscaram enaltecer determinados aspectos do país e apresentá-los como perfeitos. O resultado dessa mistura é um caldeirão de letras que expõem outra face desse Brasil tão "maquiado" por políticos, militares, escritores e artistas.
Policarpo Quaresma é um sujeito que dedicou sua vida a estudar a pátria. Comprou livros e mais livros a fim de conhecer a fundo cada característica da terra que nascera, desde às nascentes dos rios aos povos nativos quando da chegada dos portugueses. Aprendeu tupi, violão e modinha, tudo para enaltecer o que tinha como "expressão máxima da cultura brasileira". Era um homem pacato, estudioso, dedicado às letras, e em razão disso visto com estranheza por muitos.
Seus intentos por vezes terminavam mal, e a má fama o rondou, ainda assim o major não desistiu. Da cidade para o campo, do campo para a cidade. Quaresma quis provar desde a facilidade com que o país poderia atingir o máximo desenvolvimento político, até a tremenda fertilidade das terras.
Estoura a revolta. Movido pelo sentimento patriótico, Policarpo deixa seu sítio denominado Sossego e retorna ao Rio de Janeiro durante a efervescência dos governistas em derrotar a marinha revoltosa. Sua visão de mundo o leva a torna-se Major em um quartel e, movido mais uma vez pelo sentimento patriótico, transforma-se em apoiador do então presidente/ditador Floriano Peixoto, idealizando um homem preocupado com o povo, com o desenvolvimento nacional e os interesses do país.
Já nos períodos finais do conflito, Policarpo se depara com um presidente que não era nada daquilo que ele imaginou. Agora temos nosso querido personagem atuando como carcereiro dos perdedores, mas seu coração visionário faz com ele fique indignado com o tratamento do governo para com os detidos e as injustiças cometidas deliberadamente contra eles. O major, na melhor das intenções, escreve uma carta sincera para Floriano contendo sua visão acerca daquela arbitrariedade desmedida e inconsequente, como resultado é considerado um traidor máximo do governo e a partir daí temos o que é conhecido como Triste Fim de Policarpo Quaresma.
Um dos trechos mais interessantes da obra dá-se nos momentos em que Policarpo se encontra na prisão, sozinho, desolado, desiludido e decepcionado por dedicar uma vida inteira ao país e ter um fim tão indigno. Além de refletir sobre como perdera tempo nessa investida que se demonstrou vã em todos os níveis.
Obviamente o patriotismo exacerbado de Quaresma não lhe trouxe vantagens e nenhum bem, contudo, é bonito ver seu amor pelos livros, pelo saber, sua dedicação para conhecer seu país, sua terra, sua gente. Talvez, em algum grau, o Triste Fim de Policarpo Quaresma seja o mesmo reservado aqueles que optam por acreditar no Brasil e se empenham em tentar melhorá-lo de alguma maneira, mesmo precisando remar contra uma maré de ambições humanas egoístas e interesses particulares.