Darkpookie 13/02/2021
Comentário
Gostei bastante desse livro, ainda que tenha sido um esforço grande lê-lo e isso por duas razões. A primeira é a extensão da história: em quase 700 páginas e dividida em 3 partes, Dostoievski narra primeiramente o pano de fundo da história (até a página 200, 250), depois se iniciam os conflitos ideológicos, sejam eles religiosos, políticos ou sociais (da página 300 até 400,450) e, daí para o fim, aumentam as tensões narrativas, o clímax e a conclusão. Outro aspecto que dificultou a compreensão é a falta de conhecimento que eu possuo sobre a história e a política russa, assim, durante a leitura apenas fiz algumas pesquisas necessárias que foram o suficiente, mas acredito que uma familiaridade maior ajudaria a aproveitar mais os temas tratados.
Enfim, deixo um trecho do posfácio escrito pelo tradutor Paulo Bezerra que se encontra na edição da 34, e esclarece bem os propósitos da obra:
Dostoievski "[...] mostra em Os Demônios como ideias grandiosas e generosas, uma vez manipuladas por indivíduos sem consistência cultural nem princípios éticos, podem se transformar na sua negação imediata, assim como a utopia da liberdade, da igualdade e da felicidade do homem pode degenerar na sua negação, no horror, na morte, na destruição. Ideias grandiosas não podem ser geridas por mentes pequenas que não fazem senão amesquinhá-las, por seres indigentes sem condição de compreender a essência profunda da natureza humana e prezar a liberdade do homem, por pessoas que fazem das ideias objeto de compra e venda, moeda de troca com farsantes, vendilhões de liberalismo ou gente que jamais teve qualquer apreço por elas. Sem valores elevados é incoerente professar ideais elevados, e o resultado é um concubinato de nobres evoluídos e pequeno-burgueses provincianos, progressistas, niilistas, fourieristas e conservadores, administradores governamentais e altas patentes militares, e nesse concubinato passam a segundo plano as diferenças políticas e ideológicas e os que ontem apareciam como inimigos irreconciliáveis hoje se entendem e até fazem alianças. [...] O simulacro, o quinteto de Piotr Stiepánovitch, é a redução das várias tendências de um movimento à sua caricatura grotesca sob a égide de indivíduos possuídos pela ideia de poder pelo poder, que, querendo auto afirmar-se a qualquer custo, ultrapassam todos os limites, obliteram todas as objeções teóricas e obstáculos morais e criam uma engrenagem que transforma em "salvadores" e "vanguarda" da humanidade indivíduos sem consistência moral e ideológica nem condição cultural para tais papéis. Estes, para manter seu poder, apelam para dois procedimentos: cercam-se de elementos incondicionalmente submissos, cegos às questões ético-ideológicas mas de olhos bem abertos para toda espécie de benesses; e criam em torno de si a aura mítica de sábios, profetas e heróis."