Italo 30/10/2024
Eu leio muito, sempre li. Já li de tudo nessa vida, um número considerável de obras. Mas eu não consigo e acredito que nunca vou conseguir achar uma obra que me faça sentir o que eu sinto quando leio - e releio - Vidas Secas. É uma obra única.
Acho que existem poucos autores que conseguiram, de fato, transparecer a dor que sentiam de uma forma tão incrível quanto Graciliano neste livro. Talvez Kafka em O Processo ou Dostoievski em Noites Brancas, mas nenhum deles era brasileiro. Por mais que narrem fatos semelhantes, eles eram autores europeus e isso já é um fator que afasta muito o sentimento na hora de ser transmitido. Talvez essa possa ser a critica de europeus que venham a ler Vidas Secas.
A obra é dividida de forma que é possível você começar a lê-la de qualquer capítulo sem prejuízo algum.
Talvez isso seja por conta de que todos os capítulos são permeados por uma coisa em comum: a dor. A dor de quê? De viver. A dor de existir.
A dor de existir mas não a dor do ?por que? existir, mas devido a existência implica em dor. Eu defendo a teoria de que as letras narram sentimentos que nunca conseguiríamos descrever verbalmente. O obra graciliana é marcada por essa dor.
Quanta dor cabe nos olhos de um homem? Logo nos olhos de um vaqueiro igual Fabiano. Um homem bruto, que não sabe se é homem ou bicho. Muito pelo contrario, de homem só o nome - nunca foi tratado como homem.
Pelo patrão, pelos soldados amarelos ou seja, até mesmo, pela própria natureza: sempre fora visto como bicho. Se falar era a única coisa que diferencia o ser humano dos animais, nem isso sabia fazer. Era um homem simples, de poucas palavras. Somente grunhia, não aprendera a protestar.
Sempre que releio a obra penso que Fabiano poderia, sem qualquer problema, se chamar Severino.
Ambos carregam a mesma sina: a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta, a de querer arrancar algum roçado da cinza. (Neto, 1955)
A fuga da fome, a fuga dos soldados. A fuga da pobreza e a fuga da morte. Todas sempre alcançam a Gente Pobre, é inevitável.
A resignação frente a violência. As mãos que sangram e calejam. A dor de existir com um lugar no mundo extremamente definido, mas ainda assim brigar por um lugar para ficar.