Benigno_Lê 31/10/2024
O livro é muito melhor do que eu esperava.
O livro trata da breve história de uma família nordestina que fugindo da seca encontra abrigo em uma fazenda abandonada. Com a volta das chuvas, voltou também o dono das terras e tornou o pai da família, Fabiano, seu funcionário. A família fica na região até a volta da seca, então fogem do local de madrugada e vão em busca de um lugar melhor para viver e criar seus filhos (que não tiveram seus nomes ditos em todo o livro, eram chamados de filho mais velho e filho mais novo).
Com uma escrita bem seca e com frases breves, o autor mostra uma característica muito interessante da personalidade de Fabiano, ele se considera um bruto, um bicho, não um homem. Isso mostra a baixíssima auto estima dele, provavelmente por conta da maneira como foi tratado durante a vida, por não ter tido acesso à educação como o seu antigo vizinho, seu Tomás da bolandeira. O autor mostra como Fabiano se rebaixava diante dos demais, mas que ainda assim via a injustiça do mundo por estar nessa situação; revoltado, mas sem conseguir se expressar, tinha de buscar no seu vocabulário uma maneira de demonstrar seu contentamento, mas conseguiu só gritar (me refiro ao momento em que foi preso e açoitado por ter xingado um policial na rua para quem tinha perdido dinheiro no jogo e que mais tarde lhe empurrou e pisou em seu pé quando Fabiano reclamou desses dois eventos anteriores). O fato de ele ser triste por não ter sido educado, conseguir utilizar bem as palavras, pensar com clareza me atingiu de maneira diferente. Infelizmente me lembrou da minha falecida avó Dolores, que às vezes se sentia pra baixo, ou achava que era menosprezada por certas pessoas por não ter estudado até o ensino médio; acredito que ela ficava muito satisfeita de ver seu filho educado, sua nora e seus netos, que conversavam com muita educação com ela, como iguais.
O capítulo dedicado à cachorra Baleia também me deixou bem triste. Eu já sabia (desde o ensino médio) que a cachorrinha Baleia morreria ao decorrer do livro, mas não sabia que seria de forma tão triste. Ela era parte da alegria da família, do carinho, da família em si. É um personagem muito importante da trama do qual gostei muito, talvez também porque eu goste de cachorros. Detalhe interessante também é que a cachorra é tão bem descrita quanto os humanos, estes que muitas vezes conversam através de sons simples, então existe quase que uma animalização das pessoas, ou humanização da cachorra. Isso fica mais claro quando Fabiano diz que não é homem, é bicho, e vira-se para a cachorra e diz que ela também é bicho.
É uma história bem triste, seca, realista. Mas que mostra um pouco de esperança em seu fim. Apesar da maneira bruta de criar os filhos, Fabiano e a esposa, sinha Vitória, têm muito carinho um pelo outro ("A conversa de sinha Vitória servira muito: haviam caminhado léguas quase sem sentir". Quero um relacionamento assim ksksksksk) e pelos filhos. Aqueles, quando fugiam da fazenda em que viveram a maior parte do livro, conversavam que queriam ir para uma cidade grande em que pudessem educar os filhos para serem diferentes do que o pai era, para livra-los do sofrimento.
Eu gostei bastante do livro, achei-o emocionante de verdade. Acho que é uma boa leitura para entendermos os sofrimentos passados por várias pessoas de nosso país em tempo, espaço e realidade não tão distantes (e que provavelmente acontecem até hoje em dada medida). Além de entendermos um grau além, a linguagem, os sentimentos dessas pessoas, como os outros os veem.