Flávia Menezes 02/07/2022
TALVEZ AS PESSOAS SEJAM MESMO MAIS JOVENS QUANDO DORMEM.
?Vidas Sem Rumo? (título original em inglês ?The Outsiders?), de Susan E. Hinton, foi publicado pela primeira vez em 1967, e imortalizado em 1983 pelo filme de Francis Ford Coppola, que contava com grandes nomes do famoso ?Brat Pack? da década de 1980, tais como Tom Cruise, Rob Lowe, Matt Dillon, Patrick Sawyze, Ralph Macchio, C. Thomas Howell e Emilio Estevez.
Esse clássico da literatura jovem foi escrito quando a autora tinha apenas dezesseis anos, e ainda estava no High School, tendo encontrado sua inspiração ao seu redor, observando as gangues rivais dos ?socs?, os mais abastados, e os ?greasers?, o lado oposto, daqueles que viviam com poucas condições financeiras. Ou melhor, sobreviviam.
Quando eu li isso sobre a autora, eu compreendi por que esse é um livro que me impactou tão fortemente logo nas primeiras linhas, e não perdeu em um único momento sequer, esse mesmo efeito tocante. Aos dezesseis anos, escrevendo sobre garotos de dezesseis anos, ela não estava escrevendo sobre sentimentos de garotos de dezesseis anos. Ela os estava sentindo!! E quer saber? Eu também senti cada um deles. E senti tanto, que chegou a doer.
A narrativa em primeira pessoa, feita pelo personagem Ponyboy, é simplesmente carregada de emoções. Susan Hinton era uma garota de uma sensibilidade indescritível, que sentia de maneira tão voraz, que seus diálogos são tão intensos, que é impossível não sentir a dor de cada um daqueles garotos.
Garotos que viviam vidas duras. Garotos marginalizados que encontraram uns nos outros a força que precisavam para acordar todos os dias e ter alguma esperança, algum apoio. Garotos que tinham lares destruídos, disfuncionais, onde eram agredidos, rejeitados, até que não sobrasse muito deles, a ponto de traduzir toda a dor em agressividade e criminalidade.
Não há um único garoto nessa história pelo qual eu não tenha sentido carinho, ou que não tenha sofrido com a sua história de vida, mas a família Curtis, é claro, tem um lugar muito especial.
Darrel Shaynne Curtis Jr., o Darry, Soda Patrick Curtis, e Ponyboy Michael Curtis, são garotos que tiveram que aprender a cuidar uns dos outros, depois de ficar órfãos, após a morte dos pais em um acidente de carro. Essa parte já me ganhou imensamente, até porque um dos meus seriados favoritos, "Party of Five" (título em português ?O Quinteto?), de 1994, tem a mesma premissa, e confesso que já perdi a conta de quantas vezes eu já assisti essa série.
Um outro ponto que já me prendeu logo de início, é que Ponyboy é um garoto que gosta de ler e assistir a filmes. E ver que seu livro predileto era ?E o vento levou?, foi uma feliz surpresa, já que encerrei a leitura dessa história recentemente, e ainda me sinto imensamente impactada por ela. E como foi gostoso rever a história dentro dessa outra história, narrada por um garotinho de apenas dezesseis anos.
Confesso que não esperava uma história como essa, até porque não me recordo tanto do filme, pois já faz anos que não o assisto. O que até facilitou estabelecer uma conexão maior com a história, como se fosse a primeira vez que a visse sendo contada. E eu confesso que não tenho palavras para descrever em palavras tamanha força emocional existente nessa narrativa.
Como eu sou muito ligada nas emoções contidas nas histórias, esse foi um livro em que minhas emoções foram acessadas com muita profundidade, porque eu mergulhei no que aqueles garotos diziam de tal forma, que mais parecia que eu havia sido teletransportada para o local onde eles estavam, e eu os conhecesse desde que eles nasceram, a ponto de sentir um amor imenso por cada um deles.
Susan Hinton atingiu em cheio meu calcanhar de Aquiles: ler sobre o sofrimento de adolescentes. Está aí uma coisa que parece me atingir mais rápido do que uma tijolada, e as frases que ela (a autora) usou... ainda continuam ressoando dentro de mim.
A cena marcante de Dallas me levou às lágrimas, mas o bilhete que Johnny deixou para o Ponyboy dentro de ?E o vento levou?, esse me dilacerou. E que bom que eu li essa parte sozinha, sem ter qualquer chance de alguém chegar e me pegar chorando tanto, a ponto de ter que parar por um instante para poder recuperar o fôlego antes de conseguir continuar. E olha que eu nem gosto dessa receita que os autores costumam usar, de colocar cartas e bilhetes carregados de emoções para impactar o clima final de um livro. Mas esse bilhete... Ah, meu doce Johnnycake!
Sabe aquele livro que você gostaria que todas as pessoas de quem você gosta (e que gostam de ler), lessem? Então... esse é um deles. Um clássico que para mim precisa mesmo ser imortal, e que não é um simples livro sobre adolescentes delinquentes com histórias tristes. É um livro sobre como a alma humana é intensa. Mesmo as mais jovens. De como as palavras têm uma força tão grande, capaz de nos impactar de uma forma visceral. Capaz de ferir tanto quanto é capaz de curar. E cabe a nos lembrarmos disso antes de usá-las.
Eu não sei como vou conseguir começar um outro livro depois desse, porque será muito difícil superar tamanha força dessa avalanche de emoções. E acho que para conseguir terminar essa resenha, vou fechar como uma frase de Pony, que coincidentemente eu costumo dizer muito (sem a gíria final, é claro!), que diz: ?Aquilo era muito engraçado. Quer dizer, engraçado, não. Você saca?? Saco. É claro que saco, meu doce Ponyboy.