Bookdreamer 17/10/2024
Naturalismo...?
Então, mais uma vez, venho dizer que meu objetivo na leitura dessa obra é entender a escola literária que ela se engloba. Gente, meu pensamento sobre esse livro é que ele era a versão dark romance de 1800 e bolinhas porque eu fico incrédula com o tanto de bomba que foi juntada nesse livro. E eu digo isso não pra falar, de fato, mal da obra, porque sei que seu objetivo era retratar as coisas mais feias vividas na sociedade, mas porque o objetivo FOI MUITO BEM alcançado. A cada página eu ficava mais chocada com tanta barbaridade retratada que, infelizmente, continuam sendo pano de fundo para a realidade brasileira contemporânea, visto que traz aspectos encontrados dos âmbitos mais comuns aos insalubres, como a condição de miséria, abuso, traição e vigarismo vivida por tantos.
Continuando, dá pra ver claramente as características do naturalismo nesse livro: é muito parecido com o Realismo, só que foca muito mais nas partes mais feias da população, animalizando as coisas e os atos e retratando os problemas do local, trazendo também o conceito do determinismo, - o qual afirma que o homem é moldado pelo meio, ambiente e momento -, muito notório, pois dá pra ver, por exemplo, a menina, que era inocente, sendo seduzida e abusada e, então, abandonando sua vida para a prostituição, o homem trabalhador e responsável se "abrasileirando" (termo estereotipado do livro) e ficando preguiçoso e incompetente, a condição de tantas mulheres, e a ação de tanto crimes.
É uma obra que me fez refletir MUITO, de pensar que o autor pegou muita coisa do que rolava na época, que o Cortiço é a representação das "vilas'' que estavam começando a surgir.
Muitas coisas na história me fizeram ficar indignada, mas o que mais me deixou triste, foi como se deu o fim da história de Bertoleza, de como João Romão simplesmente não se importou com toda sua devoção e trabalho, e foi responsável de um fim tão trágico e, no final, ELE não teve o que merecia, mas sim apenas melhorou de vida, não só ganhando outras oportunidades, mas como também ELITIZANDO o Cortiço (que acabou levando suas descrições para o "Cabeça-de-Gato") e deixando clara a gentrificação do local, O QUE É ALGO MUITO ATUAL.
Esse "romance" também me fez pensar muito em um livro lido por mim recentemente, Quarto de Despejo, um diário de uma mulher catadora de lixo que vivia na favela nos anos 1950, e tudo o que eu conseguia fazer era associar essa história com os acontecimentos reais do diário, ou seja, comuns em 1800, comuns em 1900 e comuns nos dias hodiernos!
Digno de muita reflexão.
Minha nota não é alta, mas não porque não cumpriu o que prometia, mas pelo que senti durante as histórias descritas: tristeza, choque, agonia, nojo, pesar.
E é com o trecho a seguir, relatando como o novo local acabou se tornando o que antes era o Cortiço, que deixo essa obra arrepiante e tão realista.
"[...] E a mísera, sem chorar, foi refugiar-se, junto com a filha, no ?Cabeça-de-Gato? que, à proporção que o São Romão se engrandecia, mais e mais ia-se rebaixando acanalhado, fazendo-se cada vez mais torpe, mais abjeto, mais cortiço, vivendo satisfeito do lixo e da salsugem que o outro rejeitava, como se todo o seu ideal fosse conservar inalterável, para sempre, o verdadeiro tipo da estalagem fluminense, a legítima, a legendária; aquela em que há um samba e um rolo por noite; aquela em que se matam homens sem a polícia descobrir os assassinos; viveiro de larvas sensuais em que irmãos dormem misturados com as irmãs na mesma lama; paraíso de vermes, brejo de lodo quente e fumegante, donde brota a vida brutalmente, como de uma podridão."