Val 01/09/2021
A Ocupação: todo homem é a ruina de um homem?
Nada como ler por prazer. E a isso me levou o livro A Ocupação, do paulistano Julián Fuks, escolhido para leitura por recomendação do site literário português Wook. Fico eufórico quando adentro ao contexto de uma obra e esta me dá mais prazer pelo linguajar mágico e magnífico do escritor do que propriamente pelo enredo.
Não fossem o lastro e rastro ideológico que permeia o texto, poderíamos considerá-la uma obra de ótima qualidade literária.
Fucks escreve fácil, com muita elegância, poesia e objetivamente, sem arabescos linguísticos, apesar de suas permanentes figurações que ilustram drasticamente sua exiguidade descritiva.
Muitas obras, inclusive clássicas e consagradas, passam pelo contexto político apenas narrando-o, sem a necessidade óbvia de críticas ou de ser opinativa, tarefas que, no meu entendimento, cabem unicamente ao leitor. Não é o caso de A Ocupação, onde o autor procura infiltrar e até escancarar seus posicionamentos ideológicos em alguns trechos do livro.
A vitimização é seu estratagema na personificação do protagonista: os ancestrais morreram no holocausto, o pai sofre longamente no hospital, sua esposa teve um aborto, o cachorro de estimação também incorporou o sofrimento, as pessoas com as quais convive e compactua no hotel abandonado e por elas ocupado, são todas vítimas reais do destino e das mãos de outros homens, que promovem a guerra, o policiamento rigoroso, a esperteza nos negócios. Ou, como ele prefere, são vítimas da sociedade.
Aplicando aqui as palavras do próprio autor em outro contexto, “haveria afinal alguma virtude na simples condição de vítima?”. Claro que há essa virtude na ficção quando bem encaixada no enredo e não como linha condutora e ainda politizada.
Enfim, achei a leitura aborrecida pelo relatado e por repisar as mesmices do noticiário cotidiano. Como o próprio Fuks assume, “estou escrevendo um livro sobre a dor do mundo, a miséria, o exílio, o desespero, a raiva, a tragédia, o absurdo (...)”. E nele, apesar da excelente escrita do autor, ele não se permite ficcionar com criatividade e sua elegância e poesia perdem-se num infeliz panfleto político.
Valdemir Martins