Italo306 23/03/2020Se em Vidas Secas ( um dos melhores livros da literatura nacional) o foco é a sobrevivência no sertão, aqui o personagem principal é da elite coronelista. Fica evidente o contexto político logo no início quando o narrador decide escrever um livro junto com outros, mas logo as opiniões não batem, a logística não funciona e Paulo Honório decide narrar suas memórias sozinho. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
A trama conta a historia de Paulo Honório, sertanejo simples que começa de baixo e vai galgando sucesso, juntando dinheiro e construindo sua fazenda, usando de muita ambição e métodos inescrupulosos.
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Apesar do plano de fundo político, o foco real de São Bernardo (assim como em Vidas Secas) é o desenvolvimento do ser humano, a ascensão e declínio de quem lutou para chegar ao topo do mundo e sucumbiu incapaz de amolecer o próprio espírito e dar amor aqueles que lhe eram próximos.
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Como é ter tudo sobre controle mas querer sempre mais, sem nem saber o que almeja? Como é estar acima de todos, a ponto de ter que desconfiar até daqueles que lhe se são importantes? São essas divagações que São Bernardo faz de maneira tão graciosa. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
Uma influência de Dom Casmurro se faz evidente, uma vez que o livro também é narrado em primeira pessoa por um marido que em certo momento desconfia de sua esposa, mas o foco aqui não é a infidelidade em si e sim uma mesquinhez contra o mundo todo, uma incapacidade de entender o próximo. Assim como em Dom Casmurro, sinto falta do desenvolvimento de personagens como Madalena, não tanto para o andar da trama mas para entender melhor o que se passou com figura tão importante e que acaba tendo uma existência rasa na narrativa.
Em Vidas Secas um capítulo em especial tem peso em toda trama ( sim, você sabe qual é ) ampliando completamente o sentimento embutido na obra. Aqui temos uma sensação semelhante com o capítulo XIX, onde a narrativa linear e cotidiana é bruscamente interrompida para o autor divagar sobre o que ele se tornou e naquilo que ficou para trás.
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Uma obra maravilhosa cheia de ternura e reflexão que todo mundo deveria ler. Uma das coisas mais legais de Graciliano Ramos, é seu linguajar despojado, que é capaz de emular personagens e o mundo que os cerca e que dá vida e imagem ao sertão nordestino!