Luiza 10/02/2021
Uma leitura envolvente
Tô me devendo escrever meu comentário (ou será resenha?) deste livro já há algumas semanas. Mas, como ele faz parte dos enviados da TAG, só queria escrever após consumir todo o conteúdo - revista, podcast, resenha. Feito isso, simbora!
?O dia em que a poesia derrotou um ditador?, de Antonio Skármeta, traz como pano de fundo o plebiscito do Chile de 1988 que determinou a queda de Pinochet. A consulta foi convocada pelo próprio ditador que pretendia legitimar seu governo como democracia dando ao povo a chance de votar Sí (mais oito anos de Pinochet) ou No (convocação de eleições democráticas).
Esse é o tipo de livro que mistura realidade com ficção, de forma que a gente até sabe como termina - pra deixar claro, o No ganhou -, mas fica muito envolvido no desenvolvimento.
Curiosidade: indo na contramão da maioria das adaptações, a história é baseada numa peça, El Plebiscito, também de Skármeta, que depois foi adaptada para filme, No, com Gael García Bernal, para finalmente virar livro (com algumas modificações).
Na história do livro, temos dois protagonistas, logo, dois pontos de vista dos acontecimentos com narração em terceira pessoa. De um lado, há Nico Santos, um jovem de 18 anos que tem o pai/professor de Filosofia detido pelo regime. Seu arco gira em torno de como ele reage ao desaparecimento do pai, a procura por notícias, ao mesmo tempo em que tenta se manter longe dos holofotes da ditadura e, até mesmo, viver como um adolescente, com namorada e amigos.
Do outro lado, há Adrián Bettini, publicitário brilhante condenado ao ostracismo profissional durante a ditadura e que, de repente, e se vê à frente da campanha do No. Seus obstáculos: 1) formar um campanha única que consiga contemplar mais de dez partidos de oposição sem misturar suas ideologias; 2) convencer a população a votar pela saída de Pinochet, passando por cima de seus medos e evidências de fraude no pleito. Tudo isso em 15 min de programação; 3) vencer a sua própria descrença.
Durante o desenvolvimento das histórias que se cruzam, temos ainda perseguições, perdas, debates filosóficos e a modificação de um pensamento de medo através da mensagem de esperança, tudo isso numa narrativa muito envolvente. Sem falar das referências a acontecimentos reais como ao caso dos degolados e do melhor personagem do livro que, na verdade, é uma pessoa que existe: o Florcita Motuna, autor da ?Vals del no?. A música foi composta sob a melodia de ?Danúbio Azul?, de Strauss, e foi um dos hinos do No. E é sensacional!
Particularmente, tenho predileção pelo arco do Nico, pois descreve o ponto de vista de uma pessoa comum e de como sua vida é impactada pela ditadura. Entretanto, é muito divertido ver a construção da campanha com Bettini, com seus problemas inerentes à função de publicitário: desenvolver uma ideia, defendê-la para um cliente descrente, as dúvidas durante o processo e o contentamento quando tudo dá certo no final. Isso fica ainda mais especial quando se tem essa vivência profissional.