gleicepcouto 29/08/2012Palahniuk nos apresenta o mundo real sob o prisma do absurdohttp://murmuriospessoais.com/?p=4125
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Sabe quando um livro te vira de ponta cabeça? Quando te faz rever conceitos, ri de si mesma e da loucura do mundo no qual vive? Pode se preparar pra isso quando ler Sobrevivente (LeYa), do escritor norte americano, Chuck Palahniuk. O autor é mais conhecido pela obra Clube da Luta (é, aquela que originou no clássico filme dirigido por David Fincher e estrelado por Brad Pitt e Edward Norton) e por abordar temas inusitados e ácidos. Sobrevivente é um lançamento de 1999 e já tinha sido publicado no Brasil, mas por outra editora. O livro teve até seus direitos vendidos pra indústria cinematográfica, mas, depois do 11 de Setembro, os estúdios ficaram com receio de filmar a história...
Tudo isso porque Tender Branson sequestra um avião para cometer suicídio despencando dele no deserto australiano. Já perceberam a relação que os americanos fizeram com os ataques terroristas, né? O que é uma pena, pois esse livro, definitivamente, merecia ir pra tela grande.
O protagonista não é terrorista não, gente! É apenas o último sobrevivente de uma seita religiosa que antes de abraçar seu iminente fim, quer contar sua história de como conseguiu se tornar uma mega celebridade. Então, que forma melhor do que narrar sua vida para uma caixa preta, que, mesmo após o impacto do avião no solo, manterá esse registro?
E sim, minha sinopse é só isso. Se contar mais, perde a graça do livro.
Genial, genial, genial, genial, genial. Posso escrever essa palavra aqui mil vezes e ainda não será o bastante para descrever Sobrevivente. Palahniuk mais uma vez acerta com uma narrativa original, dinâmica e sarcástica. É uma delícia ler como uma história louca e sem pé nem cabeça faz tanto sentido. Paradoxo total.
O livro começa de trás pra frente. Literalmente da página 353, capítulo 47. Então, a última página é a de número 1. Calma, que isso não vai dar um nó na sua cabeça. Palahniuk não deixa isso acontecer. Apesar de ter uma escrita ágil, com frases curtas, quase entrecortadas, ele faz questão de mostrar apenas o suficiente ao leitor. O resto a gente preenche com a nossa imaginação. Adoro isso. Palahniuk acredita que meu cérebro consegue acompanhar sua história. Não me sinto burra.
Fato que Palahniuk tem um estilo único e uma fórmula de estrutura de narrativa que acompanha em todos seus livros. O diferencial do autor é o modo como transporta suas ideias para o papel e como consegue, através do absurdo, explicar o mundo real.
A grande atração do livro, é claro, o protagonista. Tender Branson é a personificação de uma sociedade extravagante, fútil, abitolada e decadente. Uma massinha nas mãos da grande indústria do entretenimento. E ele tem consciência disso, apenas não consegue remar contra a maré e vai se deixando levar pelos acontecimentos. Às vezes, não fazer esforço, não ter uma voz própria, é menos doloroso.
Ao longo do livro, Palahniuk destila todo seu estoque de crítica à excentricidade e do culto à fama, passando por questões sobre a natureza da fé - em momento algum, porém, sendo desrespeitoso à qualquer religião que seja. Ele apenas expõe os fatos de modo nu e cru. Estão ali para você refletir e de alguma forma trazer para a sua vida, mesclando com suas próprias experiências.
Até que ponto alimentamos essa indústria doentia que busca a juventude, o sucesso e um sentido pra vida loucamente? Até que ponto fazemos parte dela? Até que ponto gostamos dela? Chega a ser perturbador quando percebemos que fazemos parte disso tudo e mal nos damos conta. Quase como Branson, vamos deixando as coisas acontecerem, mas claro que em um nível mais comedido. Palahniuk exagera nos acontecimentos justamente pra isso: para nos acordar, para que não deixemos passar tais coisas em branco. Na confusão do dia a dia, acabamos por varrer algumas questões para deixo do tapete. Aqui, o autor tira o tapete e joga a sujeira toda de frente pra você novamente, como se nos convidasse "'Bora encarar os fatos, minha gente?"
Sobrevivente é tudo ao mesmo tempo: mordaz, ácido, delirante, hilário, inteligente, melancólico. Leitura obrigatória. Simples assim.
Avaliação:
Autor(a): Chuck Palahniuk
Editora: LeYa
Ano: 2012
Páginas: 360
Valor: $30 a $40
Extra: Você TEM que ler esse livro. AGORA.