Naty__ 19/07/2019Eu sei, é difícil encontrar pessoas que gostem de poemas. Já entendi isso ao longo de tantos anos que resenho no Blog, há mais de 12 anos, na verdade. Sei que essa resenha não vai ter tanta visibilidade, sei que os comentários serão falando que não estão acostumados com esse tipo de leitura e que vai passar a dica. Mas... estamos falando de quem? De Poe. Então, ainda que você não goste, vale a pena arriscar.
Sobre a obra:
“A morte de uma mulher bela é, sem sombra de dúvida, o tema mais poético do mundo.” Assim Edgar Allan Poe justificaria a gênese de “O corvo”, poema publicado sob pseudônimo originalmente em 1845. Mas o que faz com que esses versos hipnotizantes sobre perda e desejo, escritos de modo tão calculado pelo mestre do terror há quase dois séculos, tenham merecido tantos elogios e tamanha controvérsia?
Nesta edição, o leitor vai conhecer as traduções mais notáveis de O corvo para a nossa língua ― as de Fernando Pessoa e Machado de Assis ―, analisadas pelo poeta, tradutor e professor Paulo Henriques Britto, que também traduz três textos fundamentais de Poe sobre poesia (“A filosofia da composição”, “A razão do verso” e “O princípio poético”) e examina a faceta ensaística do escritor.
Não se engane!
Aqui não teremos apenas a obra dele, ipsis litteris. Teremos, além da sua obra original, duas traduções que serão analisadas, do ponto de vista técnico, qual se encaixa melhor e qual é mais fiel tanto às rimas quanto às métricas.
As duas versões ficam por conta de Machado de Assis e de Fernando Pessoa. Não há invenção quanto ao conteúdo; o eu lírico, triste pela morte de sua amada, passa a conversar com um corvo que aparece na janela.
No poema de Poe alguns poderiam até considerar que existe um erro em sua construção, pois há um mistério que é quebrado, em que o eu lírico revela o nome da amada, mas logo em seguida afirma que, no mundo dos vivos, ela permanecerá para sempre sem nome. E é nesse ponto que o segredo se quebra e que alguns analisam como se fosse um deslize do autor, já que é possível observar uma contradição: se neste mundo a amada não tem nome, como pode seu nome aparecer no poema?
Esse é o diferencial em que Pessoa ganha de Machado, se se tratasse de uma competição. O primeiro suprime o nome da amada ao longo de todo o texto, para fazer com que ainda exista o mistério. Nesse caso, ele não apenas traduz o poema, como trata de aperfeiçoar o trabalho original. Pessoa não apenas faz isso, ele ainda consegue seguir uma métrica que Machado não cumpre com exatidão.
Quem entende um pouco da Língua Inglesa consegue perceber que as palavras são menores do que a nossa. Por esse fator, torna-se complicado cumprir a quantidade de sílabas originais, já que é mais fácil escolher um metro um pouco mais largo, ao verter um poema do inglês para o português, para facilitar na tradução, todavia, não obedeceria (ou chegaria bem próximo) as sílabas em cada estrofe do trabalho original.
“Ao omitir o nome ‘Lenore’, Pessoa resolve a contradição mencionada anteriormente e acentua ainda mais o clima de mistério de “The Raven. Pois - pegando o fio do raciocínio de Poe, e utilizando seus padrões românticos de poeticidade - se a morte de uma bela mulher é o tema mais poético que existe, a morte de uma bela mulher cujo nome não pode mais sequer ser pronunciado neste mundo caído é algo ainda mais poético. Poeta imenso, em ‘O corvo’ Pessoa revela-se igualmente grande como tradutor.” (p. 53)
Ao ler a análise feita, vamos entender qual escritor segue melhor o original e, ainda que Pessoa tenha modificado o elemento que disse, Machado ignora características formais que são importantes para o efeito do poema sobre o leitor. Em muitos casos, ainda, ele não produz a monotonia rítmica que o original contém em cada verso. Parece besteira, para os que não entendem muito do assunto. Entretanto, são deslizes que não melhoram o trabalho de Poe e, convenhamos, não é para isso que existe a tradução. Ainda que Machado seja o meu amorzinho querido, não posso concordar com a sua obra em todo o tempo. Pessoa se mostra bem melhor nesse aspecto.
Sobre a edição:
A capa é linda e possui relevos, além de um prateado bem chamativo. Por dentro, logo no início, é possível ver vários corvos e páginas trabalhadas na elegância. A diagramação segue uma estética fora do padrão. Podemos ver ilustrações tanto na capa, quanto no miolo, assim como no decorrer das páginas também. É uma edição linda para colecionador e amante da obra.
site:
http://www.revelandosentimentos.com.br/2019/05/resenha-o-corvo.html