Duda Ribeiro 28/02/2017sucesso comercial sob a mesma velha formaresenha que desenvolvi em 23/12/09 sobre este livro:
“O Símbolo Perdido” (lançado no Brasil pelo fim de 2009, pela Sextante), é, no que tange à forma, pouco mais que um outro livro de Dan Brown. O escritor, aliás, merece aplausos por conseguir manter-se mercadológico usando exatamente a mesma estrutura narrativa o tempo todo. Não é preciso ser um leitor genial para, após conhecer uma das obras dele, conseguir chutar com certa precisão a forma com que as outras quatro vão se desenrolar. Embora “O Símbolo Perdido” apresente algumas sutilezas na história que diferem dos outros títulos do autor, Dan Brown trata seu modo de narrar quase como uma fôrma: básica e ao mesmo tempo funcional, ele simplesmente despeja ali uma nova gama de assuntos a cada novo livro, e passa a apostar suas fichinhas no conteúdo.
Muito mais que a forma, entretanto, o conteúdo d’O Símbolo Perdido é o meu tema aqui: dividindo o seu espaço com a maçonaria– que já era de se esperar -, há a ciência noética. Seu sentido não é nada de tão alienígena, já nos foi repetido diversas vezes em vídeo-documentários como “Quem Somos Nós”(“What the bleep do we know!?”), “O Segredo”(“The Secret”, ênfase nesse), de certa forma “Zeitgeist”, ou por pessoas como John Lennon, Albert Einstein, Platão, Aristóteles, Ghandi, Buda e até Jesus Cristo. A palavra “noética”, pelo menos no conceito do autor, é pouco mais que um revestimento cientificista para idéias como “pensamentos movem o mundo”, “querer é poder” ou “somos todos partes de um todo”. Uma tentativa mais racionalizada do que passional de tentar unificar o que já nos foi dito de diversas formas diferentes.
Embora há quarenta anos atrás os hippies(lê-se Beatles) tenham falado em consciência cósmica e em comungar com o universo, e desde antes da era cristã haja correntes religioso-filosóficas que defendem que tudo é feito de energia, não titubeio ao afirmar que talvez hoje não haja nada tão vanguardista –ou “na moda”, pra não ser tão sensacionalista -. A relação do homem e do mundo material com tudo o que é não-material e/ou microscópio é um assunto atual não apenas na ciência –física quântica, ciência noética, teoria do multiverso, teoria das cordas- e espiritualidade –O Segredo, budismo e influência sutis nas vivências cotidianas -, como no nosso dia-a-dia. “Energias”, “vibes” ou “pensar positivo”, Dan Brown simplesmente ajustou (mais ainda) seu barco à maré.
Basta abdicarmos do termo “ciência noética” e trabalharmos puramente com o conceito para notarmos que a física quântica, os ravers, os espíritas, os hippies, estiveram sempre dizendo a mesma coisa, com palavras diferentes. O que é mais pós-moderno que uma idéia “one size fits all”, única e ao mesmo tempo com dezenas de abordagens e nomes distintos? Tais que, ao invés de digladiarem-se por uma razão superior e abstrata, fundem-se nesse termo e apenas enriquecem o conceito final, fazendo-o algo transcendental em relação a cada um em separado. Ele mostra-se então despretensioso, um tanto inseguro –embora, gozando de sua licença poética, o autor ignore isso -, vagando entra a ciência e o misticismo, mas que, factual ou não, já é assunto. Eis aí o mérito comercial de Dan Brown.
Embora trabalhando com enigmas dessa vez mais simples e deixando as suas tradicionais “verdades contestáveis” ainda mais à mostra, me parece que o escritor viveu alguns avanços em “O Símbolo Perdido”. Os diversos personagens estão notavelmente mais bem construídos e emocionalmente envolventes –Katherine Salomon já não é mais aquela heroína genérica dos outros livros -, carregando várias sub-tramas consigo e desempenhando um papel mais sólido. O final também, embora em termos gerais siga a mesma linha dos outros títulos, já evoluiu em originalidade. Toda a história parece mais arejada e nova. Ao ler o primeiro capítulo de “Anjos e Demônios” e de “O Código da Vinci”, conferi a capa para ter certeza se não estava lendo o mesmo livro novamente.