DIRCE18 30/12/2010
"DEUS" x deus
Logo no início da leitura desse livro, gostei. Mal sabia ,eu ,que estava a minha espera um emaranhado que combinava as reminiscências de Rahel com o seu tempo presente.
Por sorte esse livro não chegou às minhas mãos uns meses atrás:não tenho dúvidas que o teria abandonado.
Felizmente acho que fiz a leitura do livro certo " O deus das pequenas coisas" no momento certo, uma vez que, vencida a estranheza e dificuldade da leitura, eu me senti "acorrentada", tal e qual as personagens do romance: Ammu ao fardo de nascer mulher na Índia, Mammachi à lembrança de maus tratos impostos pelo seu marido, Baby Kochamma à lembrança de um amor platônico, Estha à lembrança do abuso sexual sofrido e Rahel ao temor de que sua prima Sophie Mol lhe roubasse o amor de Ammu ( sua mãe).
Ammu tentou quebrar os elos da sua corrente – se envolveu com o deus das pequenas coisas, esquecendo-se, porém, que era o "Deus" das "grandes" coisas ( lê-se: leis, tradições, História, etc... etc...) quem determinava Quem devia amar. E como. E quanto, desencadeando uma sucessão de tragédia e, por isso, foi severamente punida e fez com Rahel e Estha - gêmeos dizigóticos, mas siameses de alma - também sofressem punição.
No final Rahel e Estha se re- encontram, e também eles ( pelo que eu entendi) tentam quebrar os elos das suas correntes, à despeito do que preconiza a lei do amor .
Desconhecia a autora Arundhati Roy, nascida em Kerela na Índia e, talvez, por ela ter presenciado a subjugação da mulher indiana, o sistema de castas, a influência européia na cultura indiana que fez com que, de certa forma, eles – os indianos - se sentissem "sujos", inferiores frente "à brancura" dos ingleses, pode tratar desses temas com propriedade, contudo, sem deixar de lado a sensibilidade e a beleza da escrita, uma beleza que me encantou, que me "acorrentou" e os meus "elos" só foram quebrados quando concluí a leitura.
Alguns fragmentos:
Chacko disse aos gêmeos que mesmo detestando ter que admitir eles eram todos anglófilos. (...) Voltados para a direção errada, presos do lado de fora da própria História e incapazes de retornar sobre os próprios passos porque as pegadas tinham sido apagadas (...) pág. 60
(...) o que se esperava dos paravans era que engatinhassem para trás com uma vassoura, apagando as próprias pegadas, para que os brâmanes ou cristão sírios não ficassem impuros ao pisar acidentalmente em cima da pegada de um brâmane. pág. 82
As crianças brancas e limpas, até as grandes, tinham medo de trovão. Para consolá-las Julie Andrews pôs todos na sua cama limpa e cantou para eles uma canção limpa (...) pág. 115
" (...) A prima deles chega amanhã", ela explicou para o Tio. E acrescentou casualmente: “De Londres”.
"De Londres?" Um novo respeito brilhou nos olhos do Tio. Por uma família que tinha ligações com Londres. Pág. 119
Uma mariposa fria com tufos de pêlos dorsais excepcionalmente densos pousou suavemente no coração de Rahel. No ponto em que as patas geladas a tocaram, ela se arrepiou. Seis arrepios em seu coração descuidado.
Sua Ammu a amava um pouco menos . pág. 122
(...) Pequenas bolhas de banana se afogando e ninguém poderia ajudá-las.
O Homem do Refrescodelaranja Refrescode limão podia encontrar a qualquer momento. Pegar o ônibus Cochin-Kottayam e chegar (...) pág. 205.