spoiler visualizarLeandro Moura 01/09/2017
Uma resenha subjetiva para um livro subjetivo
Acho que assim como a maioria do pessoal aqui, eu conheci a obra da Lionel Shriver primeiro pela adaptação cinematográfica. Gostei muito do filme, e estava ansioso para saber como seria a história de Kevin contada no livro e devo dizer que foi uma experiência bastante diferente da experiência que tive durante o filme.
Uma das coisas que eu mais gostei no livro é ver Eva discorrendo sobre aspectos da cultura americana, bem como eventos reais que ocorreram nos EUA na época em que se passa o livro. Teve menções à eleição de Bush em 2000, a recontagem de votos da Flórida e toda a polêmica surgida disso e mesmo o massacre de Columbine. Essa mistura de fatos reais com a história de Eva e Kevin sem dúvida deixou o livro com um aspecto bem mais realista. No mundo da literatura, é sempre meio difícil ver algum autor citando fatos e pessoas reais em seus livros, isso quando não criam uma cidade fictícia, ruas fictícias, ou mesmo países fictícios. O que eu achei realmente uma pena é que o livro termina antes dos atentados de 11 de Setembro. Realmente gostaria muito de saber o que Eva pensaria a respeito disso...
E por falar em Eva, gostei bastante de ver que o livro ressaltou bem suas origens armênias, coisa que o filme infelizmente não faz. Pode parecer um detalhe irrelevante, mas acredito que o fato de Eva ser de um povo historicamente massacrado faz todo sentido dentro da história. O livro não menciona nada disso, mas eu me peguei pensando durante a leitura se esse histórico familiar não teria afetado tanto o Kevin quanto a Celia. Hoje em dia, fala-se em traumas transmitidos geneticamente (uma teoria chamada herança epigenética). É uma coisa a se pensar, imagino eu.
Além do mais, o fato de Eva não ter ancestralidade americana e não se identificar com a cultura americana faz com que ela possa criticar o american way of life de forma mais livre. E de fato, o livro faz uma longa, incômoda e pesada crítica aos Estados Unidos. Mas, além disso, o livro também critica a forma como a maternidade é vista pela sociedade. Eva foi praticamente coagida a engravidar e mesmo assim, ela foi responsabilizada pelos atos de Kevin. Muito injusto, não é mesmo? De fato, o livro coloca o dedo na ferida mesmo, e é impossível não se sentir incomodado e angustiado em muitos trechos do livro. A coisa é tão pesada que acredito que algumas pessoas mais sensíveis vão até querer desistir da ter filhos depois da leitura!
O estilo de escrita da Lionel Shriver é bastante subjetivo e detalhista, e o livro todo tem o aspecto de um longo desabafo. Não é um tipo de leitura muito fácil de acompanhar no começo, mas depois que vc se acostuma, a coisa começa a fluir melhor. O único defeito do livro é que por volta da página 300, a leitura começa a ficar cansativa. O ritmo só volta a fluir melhor perto do final. E por falar em final, confesso que essa foi a maior surpresa da leitura! Eu realmente não esperava esse final! Não sei se o final do filme foi pouco claro ou eu que não prestei atenção, mas achei diferente do que eu estava esperando. Enfim, é uma leitura que vale muito a pena!