Destruição de um amor por trinta contos de réis. Uma união por cem contos. Um casamento nutrido pelo próprio ódio com enganoso rótulo de felicidade e cujos atores eram uma bela e rica jovem órfã e um moço pobre, mascarado como de alta classe.
O que mais dizer? "A história é verdadeira [...]". "O suposto autor não passa rigorosamente de editor." Ao menos, é o que afirma o José de Alencar no prefácio de seu romance, Senhora.
Cheio de surpresas, o romântico romance nos atrai cada vez mais a devorarmos suas páginas, porém com o requinte e a paciência necessários à lenta e perfeita trituração e mastigação, extraindo a seiva mais interna e profunda, presente nas entrelinhas ou, até mesmo, nos pensamentos de nossos protagonistas. Não podemos negar, contudo, que em muitos casos, a ajuda de um dicionário será quase essencial.
Amando os detalhes, conversando com o leitor e ora usando seu poder de autor, ora não, para penetrar nas mentes dos personagens, José de Alencar nos leva a um cenário na alta sociedade fluminense, cuja estrela a raiar era a, um tanto curiosa, Aurélia Camargo.
O romance é dividido em quatro partes. Seus títulos referem-se a uma relação mercantil. A primeira, "o preço", percorre o presente, "quitação" vai ao passado e retorna após, é a que apresenta mais informações. O autor pecou um pouco na monotonia da terceira parte, "posse", mas a esse ponto poucos desistem à leitura. Quanto ao fim, é interessante que este só se torna claro após a leitura da última palavra, contando com inesperados acontecimentos em sua quarta parte, "resgate".
A leitura de Senhora vale o tempo gasto. A reflexão com base nela, mais ainda. E um ótimo ponto a se refletir é a relação entre a duvidosa mente dos personagens e a enganosa aparência que apresentavam. Ou melhor, entre o rótulo e o conteúdo.