Os demônios

Os demônios Fiódor Dostoiévski




Resenhas - Os Demônios


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Elton 20/03/2021

Livro mais político de Dostoiévski
Publicado um pouco mais de10 anos após o fim do regime de servidão na Rúsica, Os DeMõnios é o livro mais político escrito por Dostoiévski. No romance o clássico escritor russo faz críticas ferozes às ideias progressista em ascensão na época e defende os valores da nobreza russa e da igreja ortodoxa.
É um livro conservador, pode-se dizer até reacionário, mas que serve como interessante objeto de estudo sobre o período de transição que se iniciada na Rússia a partir da década de 1860.
A obra é recheada de personagens tanto variados como ricos e bem construídos. O desenrolar da trama intricada é interessante de acompanhar, principalmente a partir do final da parte I, quando as personagens mais importantes já foram apresentadas e toda a história começa a ganhar mais forma.
Não é um livro recomendado para começar a ler o autor, mas sem dúvida um que ser lido.
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Vanessa1139 22/06/2024

Demorei muito até resolver escrever essa resenha, não por esse livro não merecer, e sim por não ter palavras para expressar o que sentir lendo-o, ainda não tenho palavras, mas tentarei mesmo assim.
A literatura russa sempre tão rica em debates internos da natureza humana tem sem dúvida como um dos maiores exemplos Os Demônios, nunca um livro me fez vislumbrar o espírito niilista de maneira tão nítida e tangível, com sua gritante e angustiante falta de sentido na vida que aparentemente o único caminho possível é a não existência. O não ser passa a ser o único sentido, o único caminho.
Pode parecer triste, no entanto, nem a tristeza faz sentido, a vida apenas é, sem esperar que tiremos motivos ou razões dos caminhos tortuosos pelos quais ela passa e se para alguns as doces ilusões de riquezas na terra e no céu são o suficiente para apaziguar o coração, para outros essas mesmas ilusões não dizem nada, são apenas elaboradas mentiras contadas para crianças em seu leito, e esses sim, talvez enxerguem como é o mundo mesmo sem pinta-lo de cor de rosa, sem enfeita-lo e sem esperar dele nada além do fim, sabem que o mundo apenas é o que é e nunca teve intenção de fazer maior sentido para nós, meros mortais.
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Thiers.Neto 22/11/2020

As vezes é de se assustar como o livro retrata alguns pensamentos e métodos de ação na política que só vieram a acontecer no século XX e que de vez em quando reaparece nos dias de hoje. Valeu o esforço da leitura!

"A leitura do romance hoje deixa a impressão de que nada parece haver mudado na essência, de que houve apenas uma renovação dos cenários sociais e mudanças de traje das personagens... Cabe salientar especialmente que Os Demônios foi escrito não tanto sobre diferenças, embora no romance elas sejam de princípios, que infelizmente não perdem sua atualidade. Como se pode constatar, nosso cotidiano está literalmente superpovoado de personagens de diferentes escalas saídos de Os Demônios, que são encontrados entre 'direitistas', 'esquerdistas', 'conservadores' e 'liberais'... 'quadros' e 'extraquadros' burocráticos. Por assim dizer, os demônios estão em toda parte. Eles logo se reconhecem uns aos outros; uns, em sua ávida procura da verdade e movidos pelo desejo sincero de mudanças progressistas, não se dão conta de que se encontram num turbilhão de demônios."
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tortajulia 09/10/2022

"Não há nada secreto que não se torne evidente."
"Os demônios" de Dosteiévski é um livro complexo e denso, de forma que foi uma leitura desafiadora para mim. No início, principalmente nas primeiras 200 páginas, foi difícil me localizar em relação aos personagens. Todavia, me interessei muito pela história e pelos caminhos que Fiódor Dostoiévski traça ao longo dessas 700 páginas.

Como personagem principal se faz presente Nikolai Stravrógin, rapaz de 29 anos que pode ser comparado a Hamlet da obra shakesperiana. É associado a um grupo revolucionário liderado por Piotr Stiepánotvitch, mesmo que não possua aspirações desse tipo. Durante a narrativa, podemos acompanhar as inúmeras vozes que levam os demônios de jovens engajados politicamente a remorsos e assassinatos.

Inspirado em um caso verídico, "Os demônios" é um livro marcante!
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herbert40 01/09/2021

a única condição essencial à existência humana é que o homem deveria ser capaz de curvar-se perante algo infinitamente grande. se os homens forem privados do infinamente grande, não continuarão a viver e morrerão em desespero. o infinito e o eterno são tão essenciais ao homem como o pequeno planeta no qual habita.
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Tiago 25/03/2017

A SINFONIA DO TORMENTO
No século XIX centenas de grupos revolucionários radicais – niilistas, socialistas e anarquistas – agitaram o cenário político da Rússia imperial. Em 21 de novembro de 1869 o estudante S.G. Nietchaiev, na companhia de mais quatro membros da organização “Justiça sumaria do povo” (Naródnaia Raspava) assassinaram o estudante I. I. Ivanov. O crime teve repercussão em todo o país. Preocupado com os rumos destrutivos dos movimentos da esquerda radical, Dostoievski escreve o magistral romance “Os Demonios”, cujo objetivo é expor a face dos verdadeiros demônios da sociedade de sua época: o fanatismo, a busca por dominação absoluta, a subordinação total do individuo a lógica e ao rigor cientifico e o estoicismo político diante de um propósito comum. O próprio ateísmo é duramente atacado pelo autor que defende a importância da fé religiosa na constituição de uma esfera moral. Embora se trate de um conceito primitivo e contestado por filósofos contemporâneos, como o francês Jean Paul Sartre, essa noção de que a fé purifica o homem ganhou ressonância nas palavras de um grande escritor. Não se trata apenas de uma reprodução literária de um fato real ou de uma simples propaganda antirradical e anti-ateísta. Dostoievski vai muito além desse conceito inicial criando uma obra que explora os perigos da sociedade russa de sua época.
Stiepan Trofimovitch é um professor acadêmico que havia construído uma carreira promissora no exterior. Apesar desse seu aparente sucesso profissional seus dois casamentos haviam sido um fracasso. Devido a “um turbilhão de circunstancias” - que o narrador não acha apropriado esclarecer - Stiepan é afastado de seu cargo na universidade e parte para a propriedade Skvoriechniki, uma magnífica fazenda da família Stavroguin. A proprietária era uma rica viúva chamada Varvara Pietrovna Stavroguina, amiga de longa data de Stiepan, descrita como ossuda, de rosto longo e “rancorosa ao ponto do improvável”. Ambos possuíam uma estranha relação de amizade. No passado Stiepan havia recusado duas propostas da rica e solitária viúva para que se encarregar-se da educação particular de seu único filho. Após a morte de sua segunda esposa Stiepan, sem emprego e sem saída, resolve aceitar o convite.
Assim que chega a Skvoriechniki, Stiepan se encontra diante de uma segunda proposta, dessa vez de casamento. A ideia teria partido da própria Varvara que queria unir Stiepan a uma mulher chamada Daria Pavlovna. Varvara escondia suas reais intenções por trás dessa união arranjada: circulavam rumores de que seu filho já havia tido um relacionamento com Daria no passado e diante da expectativa do seu retorno, Varvara pretendia retirar Daria do caminho de seu único herdeiro. Stiepan, que parecia nutrir um amor platônico por Varvara sofre com a ideia do casamento, mas não encontra meios de recusar a união. Esse dilema familiar que inicia a obra “Os Demônios” se arrasta até o primeiro marco importante da obra: a recepção oficial do noivado de Daria e Stiepan. Aqui os dois principais personagens aparecem: Piotr Stiepánovitch e Nicolai Stavróguin, filhos de Stiepan e Varvara respectivamente.
Nicolai, um jovem de 25 anos, bastante conhecido por sua libertinagem havia levantado suspeitas depois que um envelope com dinheiro enviado em seu nome a Maria Timofêievna, uma mulher extremamente magra, de pescoço longo, coxa e aparentemente louca, havia sido interceptado pela própria Varvara. Os boatos de que Nicolai teria se casado em segredo com Maria preocupavam sua mãe que traçava planos diferentes para seu filho. Esse típico drama familiar da sociedade europeia do século XIX é apenas um preâmbulo do magistral romance de Fiodor Dostoievski.
Dividido em 23 capítulos e três partes a obra possui um imenso quadro de personagens, todos eles descritos em sua forma física, moral e social, tendo, portanto uma densidade absurda e fascinante. Essa construção em três dimensões expõe uma valorização estética, que na realidade está subjugada ao conteúdo moralizante da obra. Trata-se, sobretudo, de um romance da moral, aqui analisada em termos políticos é praticamente condicionada aos valores religiosos do individuo como ser social.
O que começa como uma espécie de crônica do mundo burguês, cômica e com certa dose de sarcasmo, sofre uma reviravolta espetacular a partir da terceira parte, marco clássico da obra, onde cada personagem se desdobra e revela sua verdadeira identidade moral. O autor se vale de sua genialidade criativa e nos expõe a verdade por trás da face social de cada personagem, alimentando o típico comportamento humano de consolidar a impressão inicial como uma verdade absoluta. É ali que os verdadeiros focos da narrativa emergem em sua plenitude: o niilismo - movimento caracterizado pela descrença absoluta -, e o radicalismo revolucionário.

Stepanovitch e Stavróguin fazem parte de um grupo niilista de proporções internacionais que os encarrega de iniciar uma revolução na cidade onde vivem. Juntos eles formam um grupo radical de indivíduos desprovidos de qualquer traço moralizante, movidos unicamente por um propósito comum. Chigalov, o ideólogo do grupo, teoriza um método de governo extremamente autoritário onde nove décimos da sociedade seria submetida ao controle rigoroso do décimo restante, composta pela elite intelectual.
“No esquema dele [Chigailov] cada membro da sociedade vigia o outro e é obrigado a delatar. Cada um pertence a todos, e todos a cada um. Todos são escravos e iguais na escravidão, nos casos extremos recorre-se à calúnia e ao assassinato, mas o principal é a igualdade. A primeira coisa que fazem é rebaixar o nível da educação, das ciências e dos talentos. O nível elevado das ciências e das aptidões só é acessível aos talentos superiores, e os talentos superiores são dispensáveis! Os talentos superiores sempre tomaram o poder e foram déspotas, sempre trouxeram mais depravação do que utilidade; eles serão expulsos ou executados. A um Cícero corta-se a língua, a um Copérnico furam-se os olhos, um Shakespeare mata-se a pedradas – eis o Chigaliovismo.”
Kirilov, tomado pelo “demônio de voluntarismo”, defende a teoria segundo a qual o homem que comete suicídio se torna Deus:
“Se Deus existe, toda vontade lhe pertence, e fora dessa vontade nada posso. Se ele não existe, toda vontade me pertence, e devo proclamar minha própria vontade. (...) Tenho que meter uma bala na cabeça porque o suicídio e a manifestação suprema da vontade.(...) Deus é a dor do medo da morte. Quem vence a dor e o medo se tornará Deus.”
Chátov acredita na existência de um “Deus nacional”, sendo este representado pela supremacia de um grande povo sobre os povos restantes. Além destes estão Virguinski, Liputin, Tolkatchenko, Erkel, e os dois protagonistas: o libertino Stavróguin e o insuperável Stepanovitch, a mente mais perversa da obra e um dos personagens mais diabólicos da literatura universal. Todos eles se admiram e se odeiam com igual intensidade dentro de um circulo restrito onde a idéia de revolução se deforma diante de uma lógica tão absurda que se torna destrutiva. Para cada um deles a violência é o aparo lógico de um dogmatismo que, apesar de embrionário, já manifesta sua natureza refrataria e intolerante. O ceticismo radical que os domina só realça o típico ser dostoievskano, em movimento constante entre a certeza e a incerteza.
Da terceira parte em diante o romance mergulha num turbilhão de conspirações, assassinatos, traições, suicídios até atingir o ápice da narrativa: o incêndio que toma conta da cidade e cujo objetivo era desviar a atenção da população para longe do assassinato brutal que acontecia dentro de uma das residências de um quarteirão afastado. Vemos uma sequência de atos deploráveis e indescritíveis, como o abuso de uma menina de apenas doze anos por um dos integrantes do grupo e cujo tormento moral o leva ao suicídio. O caos, a destruição, a descrença e o estoicismo fanático dão um ritmo alucinante à narrativa cujo desfecho não poderia ser menos trágico.
Ler “Os Demônios” e adentrar numa narrativa pesada, intrigante e apaixonante do inicio ao fim. Ao perceber que as ações humanas não possuem a moral como regra única, Dostoievski soube explorar esse aspecto negro e moldá-lo como recurso de criação artística antecipando a tragédia que se abateria sobre o século XX, imposta pelos exemplos de fanatismo político e ideológico como o Nazismo e o Stalinismo. Através da exposição dos males da modernidade ele extrapolou os limites de criação literária e compôs o que a historiadora Anna Carolina Huguenin chamou de “sinfonia de vozes atormentadas”.

AUTOR
TIAGO RODRIGUES CARVALHO

site: http://cafe-musain.blogspot.com.br/2014/05/a-sinfonia-do-tormento-os-demonios-de.html
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Diego Rodrigues 19/02/2020

Obra atemporal
"Os Demônios" talvez seja o romance mais político de Dostoiévski. A obra foi inspirada em um fato ocorrido na Rússia do século XIX, mais precisamente no ano de 1869: o assassinato do estudante I. I. Ivanov pelas mãos do grupo niilista liderado por S. G. Nietcháiev. Esse acontecimento chocou e gerou reflexões tão profundas no autor que, mesmo estando envolvido na construção de outras obras, se sentiu obrigado a fazer uma pausa para escrever sobre o episódio.

Apesar de ser inspirado em um acontecimento real, Dostoiévski cria seus próprios personagens para representar as pessoas reais envolvidas e assim compor sua ficção baseada em fatos. Muito criticado na época de sua publicação, "Os Demônios" se tornou muito mais do que um registro político, mas também histórico, social, filosófico e religioso. Além de retratar muito bem o que era a Rússia na época em que foi escrito (temos aqui um amplo mergulho do cenário psicológico do povo russo) o livro também foi profético ao explicar os princípios do "Chigaliovismo", um vislumbre do que viriam a ser as ideias adotadas por Stálin e Hitler. Ainda na atualidade, "Os Demônios" serve como um alerta do que pode acontecer quando política e ignorância se fundem resultando no fanatismo e quando mentes pequenas tentam alcançar o poder pelo poder a qualquer custo.

Como é típico de Dostoiévski, o livro é denso e com uma grande gama de personagens. Foi uma leitura lenta porém não desprovida de prazer e de reflexões. O romance é um pouco truncado mas ao concluí-lo e perceber que aqui o principal personagem é o cenário político temos uma compreensão mais ampla da genialidade que o autor teve para construir essa obra atemporal. Com certeza fecho esse livro com a mente mais enriquecida e ciente de que os demônios da Rússia do século XIX infelizmente ainda assombram a nossa sociedade nos dias de hoje.

site: https://discolivro.blogspot.com/
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Conrado 26/10/2023

Dostoiévski coloca o niilismo da sociedade russa e seu potencial destrutivo em evidência
A inspiração para "Os Demônios" veio de um evento real que aconteceu na Rússia: o assassinato do estudante Ivanov por um grupo de radicais niilistas em 1869. O niilismo foi uma corrente que influenciou o pensamento de muitas pessoas da geração de Dostoiévski. O romance é uma obra de expor e denunciar uma parcela da sociedade russa que aderiu a ideias niilistas.

O livro é um calhamaço, mas a leitura flui de uma forma extremamente fácil pelo estilo de escrita do autor. O narrador desta obra é um dos melhores da obra do escritor russo. Ele é um personagem que participa da história que está contando ao público e tem um olhar incisivo e com uma veia cômica para os acontecimentos. A princípio, o romance tem um tom muito forte de sátira. Os personagens e as situações são propositalmente exagerados. O livro não quer apenas criticar essas figuras niilistas, mas ridicularizá-las e tirá-las do pedestal em que se enxergam. Quase todos esses personagens, apesar de inicialmente parecem ridículos, têm camadas psicológicas muito profundas (principalmente Chatóv, Nikolai, Stiepán e Kirilov) – uma característica comum de qualquer romance do Dostoiévski.

Apesar da proposta do romance inicialmente ser panfletária, a obra não perde a qualidade artística intrínseca a uma boa obra de literatura. Isso se deve a habilidade do autor, que é um dos maiores escritores da história. "Os Demônios" é considerado um dos melhores livros do autor russo com razão.
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herbert40 21/06/2020

elegante e inteligente
"sua ideia é sórdida e imoral e exprime toda a insignificância da sua evolução. peço que não se dirija mais a mim."
virou minha frase de cabeceira, e vou usá-la para refutar pensamentos imbecis que sou obrigado a ouvir quase que diariamente. um livro necessário e obrigatório.

site: https://filmow.com/usuario/herbert_
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Marcio 19/03/2022

Porcos no poder...
O livro é uma grande dissertação sobre o niilismo e o materialismo que enraizava-se na intelectualidade da época; nada diferente de  hoje onde esse mesmo pensamento de utilitarismo tomou todos os meios de discussão sufocando e matando qualquer outro tipo de abordagem, vista pelos doutores como ultrapassada, obscurantista entre outros adjetivos.

Em relação ao livro em si, independentemente do tema e da problemática abordada, sua leitura foi uma das mais difíceis do autor. (Ainda não li Irmãos Karamazov). O que salva a narrativa é o final absurdamente bom na minha opinião. O problema é a gigantesca contextualização do ambiente feita por Dostoiévski, o que é um ponto comum de suas obras, mas aqui é elevado a enésima potência.

Arrisco dizer que 70% do livro é basicamente a apresentação dos personagens e do contexto que se cria para o grande final. Realmente no final do livro cada linha das intermináveis descrições acaba fazendo sentido, mas acredito que poderia ser reduzido um bom trecho se determinados fatos e diálogos pudessem ser mais condensados...mas daí também não seria Dostoiévski sendo Dostoiévski. É uma questão irreconciliável.

De qualquer forma recomendo a leitura devagar e sem nenhuma pressa. Levei quase 2 meses pra ler as 777 páginas, mas não me arrependo.
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Marcos606 24/03/2023

Vagamente baseado em reportagens sensacionalistas da imprensa sobre o assassinato de um estudante de Moscou por colegas revolucionários, ele retrata o caos destrutivo causado por agitadores externos que se mudam para uma cidade provincial moribunda. O enigmático Stavróguin domina o romance. Sua personalidade magnética influencia seu tutor, o intelectual liberal poseur Stepan Verkhovensky, e o filho revolucionário do professor, Pyotr, assim como outros radicais. Stavróguin é retratado como um homem de força sem direção, capaz de bondade e nobreza. Quando Stavróguin perde a fé em Deus, no entanto, ele é tomado por desejos brutais que não compreende totalmente.
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Cadu 02/05/2020

Premonição: retrato realista dos dias atuais
Uma leitura de Dostoiévski nunca é fluida, clara e inocente: espere por uma trama repleta de informações nas entrelinhas, leitura densa proporcionada por personagens complexos, clima pesado e obscuro, trama intrincada que obriga a constantes interrupções, para fins de análise e reflexão na tentativa de compreender melhor, o que torna a leitura lenta e por vezes cansativa mas não menos prazerosa. Conhecer o contexto histórico e sócio-político, tanto do momento retratado na narrativa como da época em que foi escrito, auxilia o entendimento daquilo que o autor quis transmitir.
Após a ?Reforma Camponesa? de 1861 houve uma proliferação de grupos de esquerda (ditos revolucionários) na Rússia, principalmente nos anos 1860 e 70 e a atuação política desses grupos era foco constante da atenção de Dostoiévski.
Em novembro de 1869 o assassinato do jovem I.I. Ivanov, membro de um desses grupos, pelos próprios companheiros chama a atenção do autor e inspira a criação de ?Os Demônios?, que assume abertamente um tom panfletário e isso não é segredo. Inclusive o líder do grupo envolvido no assassinato real, o estudante S. G. Nietcháiev, inspira a construção do personagem Piotr Stiepánovitch. Porém, não obstante esse assunto que domina o rumo dos acontecimentos existe mais de uma trama no romance, centradas em vários personagens que de alguma forma acabam se cruzando em algum momento da história, como em outros livros do autor.
A edição da 34, traduzida diretamente do russo, traz um último capítulo (?Com Tíkhon?) cuja inclusão foi feita posteriormente pelo autor e terminantemente recusado pelo editor, acrescentado à obra de forma póstuma, constituindo ponto culminante (e perturbador) da narrativa e que foi responsável por elencar o personagem Nikolai Vsievolódovitch Stavróguin no hall dos meus personagens prediletos de Dostoiévski ao lado de Ivan Karamázov, Rodion Raskólnikov e Parfen Rogójin.
Por fim o posfácio do tradutor Paulo Bezerra (que na minha opinião deveria ser ao invés um prefácio) sintetiza com primor os principais pontos da narrativa e revela a assustadora atualidade da obra, tomada como ?romance-profecia?, e vale cada minuto da nossa atenção.
?Dostoiévski (...) mostra em *_Os Demônios_* como idéias grandiosas e generosas, uma vez manipuladas por indivíduos sem consciência cultural nem princípios éticos, podem se transformar na sua negação imediata, assim como a utopia da liberdade, igualdade e da felicidade do homem pode degenerar na sua negação, no horror, na morte, na destruição. Idéias grandiosas não podem ser geridas por mentes pequenas que não fazem senão amesquinhá-las (...) Sem valores elevados é incoerente professar ideais elevados?.
Isso atinge de forma cirúrgica os acontecimentos no campo sócio-politico-cultural que tem dominado as últimas décadas não só no Brasil como no mundo.
Mais atual, impossível!!
Leitura obrigatória!!
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Wanderley 11/02/2023

Os porcos da intolerância
Em 1872, Fiódor Dostoiévski publicou Os Demônios, romance de características, a meu ver, premonitórias (a percepção de que os sentimentos do presente gestavam uma realidade futura sombria e próxima), escrito a partir de um caso real: o assassinato do estudante Ivan Ivanov por seguidores de Serguei Nietcháiev, um dos autores de O Catecismo Revolucionário (1869), livreto que defende, em nome de um novo mundo, o terror e o assassinato como métodos políticos.

O enredo de Os Demônios narra o início e o desenvolvimento das atividades de um grupo de jovens niilistas sem perspectivas, uma espécie de célula política com função desestabilizadora. Sua motivação é a raiva. No começo, parecem patéticos, pois são poucos e às vezes deliram. Mas eles sabem que existem outras células (que não se conectam diretamente para em caso de prisão, não conseguirem delatar as demais). Seus membros se imiscuem em vários órgãos do Estado e sua missão é criar problemas, de forma a excitar o descontentamento geral e preparar uma revolta que é, sobretudo, um desejo de vingança. A distância entre o deslumbre dos salões nobres e a miséria dos camponeses na Rússia, entre o luxo dos poderosos e as necessidades dos cidadãos comuns, alimenta um ressentimento social pronto para ser manipulado por fanatismos religiosos e políticos.

Uma das difculdades do livro é a grande quantidade de personagens. Mesmo assim, de modo brilhante, quase sobrenatural, Dostoiévski expõe aos seus contemporâneos, as bases de um processo de degradação social que terminaria, quase cinco décadas depois, na Revolução Russa e seu legado de horror: 30 milhões de vítimas. Mais do que isso, ele desnuda a gênese de qualquer movimento radical que pregue a destruição como método, no que eles têm em comum: o ódio ao contraditório.

Li Os Demônios em 2014 e desde logo fui obrigado a concordar com Albert Camus, para quem Dostoiévski – e não Karl Marx – é o grande profeta do Século XIX. De fato, 45 anos antes do totalitarismo Russo, seguido depois pelo Alemão e tantos outros, de diversas fontes ideológicas, Dostoiévski captou logo no início a essência daquelas manifestações que mudaram a Rùssia e o mundo.

Logo no início de Os Demônios há uma passagem bíblica, o Evangelho de Lucas (8, 32-36), que dá título ao livro: "Uma grande manada de porcos estava pastando naquela colina. Os demônios imploraram a Jesus que lhes permitisse entrar neles, e Jesus lhes deu permissão. Saindo do homem, os demônios entraram nos porcos, e toda a manada atirou-se precipício abaixo em direção ao lago e se afogou. Vendo o que acontecera, os que cuidavam dos porcos fugiram e contaram esses fatos, na cidade e nos campos, e o povo foi ver o que havia acontecido. Quando se aproximaram de Jesus, viram que o homem de quem haviam saído os demônios estava assentado aos pés de Jesus, vestido e em perfeito juízo, e ficaram com medo. Os que o tinham visto contaram ao povo como o endemoninhado fora curado".

É uma imagem poderosa, pois o mundo parece ainda parece bem agitado por demônios que habitam os porcos da intolerância, à procura de um abismo.
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Karin né? 19/01/2023

Os capirotos da vida mundana
??para abalar sistematicamente os alicerces, para decompor sistematicamente a sociedade e todos os princípios; para desencorajar todos e transformar tudo num mingau, e depois, quando a sociedade ficasse, dessa maneira, desengonçada, esmorecida e doentia, cínica e descrente, mas com alguma cede infinita de alguma ideia norteadora e de sua autopreservação, para dominá-la de supetão, hasteando a bandeira da rebelião??

Essa não é uma resenha sobre a perspectiva geral do livro, até porque eu acredito que mesmo que tentasse, não conseguiria analisar todos os pontos relevantes dessa narrativa, bem como a sua construção em si. É só um comentário sobre um ponto específico que me chamou atenção já nas últimas páginas:

Você já ouviu o ditado ?cachorro que ladra não morde?? Então, esse é um ótimo exemplo do que aconteceu aqui, ao longo da história nós percebemos a dinâmica desse grupo secreto, suas conversas e aspirações, a teor sempre foi duvidoso mas no final eles se veem na precisão de bolar algo extremo, algo que exigiria que eles saíssem do teórico e sujassem as próprias mãos. É interessante perceber que durante o encafifar da peripécia todos se mostravam dispostos, falando do futuro morto com tanta impessoalidade que parecia até que estavam falando sobre como matariam um peru de natal, mas quando acontece de fato eles perdem totalmente o fio da meada pois dão de cara com a realidade terrível do que estavam fazendo, e isso é o suficiente para enlouquece-los, ou pelo menos a maioria deles.
A verdade é que cada personagem do livro carrega um demônio dentro de sua própria história, que os engole aos poucos, matando-os por fim, tirando qualquer traço de sanidade que poderiam ter, ou qualquer vestígio de paz que poderiam desejar.

É um livro denso, mas isso não é novidade, no começo pode gerar desconforto pra o tipo de leitor que ainda não é habituado, mas logo você se acostuma e passa a esperar por esse exagero de detalhes, e no meu caso, foi justamente isso que me deu certa frustração em relação ao final, pois não é um final altamente descritivo, ele é suficiente para o entendimento e fechamento da história, mas nem de longe é descritivo como as partes anteriores.
Como é o meu primeiro livro do autor, não sei se é um costume dele, se é algo intencional pra trazer a tona algum sentimento? mas de todo modo, não estraga a experiência, e com certeza não tira o mérito dessa obra incrivelmente crítica e visionária.
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